Cotidiano

No Amapá, conflitos de terra crescem nos últimos anos





 

Segundo a Comissão Pastoral da Terra, o aumento descontrolado de plantações de soja e a falta de fiscalização são os principais elementos que favoreceram este cenário.

 

Em todo o Brasil, os conflitos de terra vêm se intensificando nos últimos anos. De acordo com o relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), este cenário provocou a morte de 70 pessoas em 2017, o maior número desde 2003.  No Amapá, o agronegócio e a falta de fiscalização são as principais causas do aumento no número de casos.

O Estado do Amapá conta atualmente com 8.507 estabelecimentos agropecuários, que ocupam uma área total de 1.506.294 hectares. Em comparação com o censo do ano anterior, constatou-se um crescimento de 72%. O uso de agrotóxicos por produtores dentro do estado também cresceu. 1.036 produtores utilizaram agrotóxicos em 2017, um aumento de 341% em relação a 2016. Os dados são do Censo Agro, publicado no último mês.

A CPT é reconhecida pela sua atuação em questões agrárias, prestando assessoria às populações marginalizadas (quilombolas, indígenas, ribeirinhas e extrativistas, por exemplo). É uma instituição sem fins lucrativos, criada em 1975, pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). O Padre Sisto Magro, coordenador da CPT-AP, concedeu entrevista ao Jornal do Dia e falou sobre o cenário local.

Ele disse que, nos últimos anos, com o aumento descontrolado de plantações de soja, houve igualmente um crescimento no número de conflitos. “Eles plantam em uma área (e é nesse período que é o conflito), envenenam, colhem e somem. Porque no Amapá não é como no Mato Grosso, que o cara faz duas ou três colheitas num ano. Aqui é só uma e olha lá! Eles somem e só voltam no próximo plantio”.

A falta de fiscalização é um dos principais elementos que favoreceram este aumento. “Eu denuncio ao Ministério Público, e ele chama o Imap para fiscalizar. Como é que o Imap, que defende uma linha de apoio ao agronegócio como forma de desenvolvimento do Amapá vai fiscalizar os desmandos que são feitos pelos empresários licenciados por ele mesmo? Não é possível uma coisa dessas.”

O Imap (Instituto do Meio Ambiente e de Ordenamento Territorial do Estado do Amapá) é o órgão responsável por expedir o licenciamento ambiental, que autoriza os empreendimentos utilizarem recursos naturais. Segundo o coordenado do CPT-AP, há muitas irregularidades.

“Na AP-070, tem um senhor que tem 7 placas de licenciamento pelo Imap. Ou seja, 7 posses. Como é que uma pessoa pode ter 7 sete posses, se a lei diz que ele só pode ter uma, no máximo? Ele não pode ser arrendatário de posse, porque ela só pode ser exercida diretamente pela pessoa”, exemplificou.

“Eu tô acompanhando um caso em que um senhor alega ser arrendatário de 13 imóveis, uma delas, inclusive, no Ambé, que é uma terra quilombola. A lei diz que você só pode ser posseiro de uma só área em terras federais, então aplica a lei, deixa ele com uma área e tira as outras 12. Pronto, acabou o conflito”, continuou.

Padre Sito Magro também falou sobre a falsa ideia de geração de emprego.  “Quando é que o negócio é mais rentável? Quando mais você produz pagando sempre menos salários. Se o agronegócio disser que vai empregar um monte de gente, ou é um agronegócio burro ou é um agronegócio desonesto. Eu prefiro pensar na segunda oportunidade, porque burros eles não são, eles são bem espertos”.

Indagado sobre como a administração pública pode atuar no combate, ele disse: “É só seguir a lei. A posse, por exemplo. A maioria desses empresários que chegam aqui não são posseiros de fato. Se a pessoa não é daqui e não exerce a posse de forma direta, então ela não tem direito. Segunda coisa: a lei diz que as áreas de terras públicas, que serão repassadas da União para o Estado, devem ser, preferencialmente, destinadas à agricultura familiar, assentamentos extrativistas, manejos sustentáveis. Então, é só aplicar a lei, que tudo se resolve”, finalizou.

 Da Redação