Saúde

Mesmo lenta, vacinação aponta para queda de mortes por covid-19 no Brasil





Queda na média geral de mortes por covid-19, desaceleração nas internações, diminuição de óbitos entre os idosos. Depois de cinco meses e meio do início, a vacinação começa a apontar indícios de que está fazendo efeito na melhoria dos indicadores no Brasil, apesar de os índices gerais da pandemia seguirem em patamares altos.

Até o final de junho, o Brasil havia imunizado 26,27 milhões de pessoas (12,41% da população) com as duas doses ou dose única, e 73,5 milhões (35%) com a primeira dose. Para médicos e pesquisadores ouvidos pelo UOL, o avanço da vacinação, mesmo que lento, aponta para o resultado direto para a queda em indicadores, em especial dos grupos protegidos.

Eles alertam, no entanto, que a pandemia está longe de acabar. Ao comparar os óbitos da pandemia no ano passado, antes do início da imunização, em 17 de janeiro, com os deste ano, vê-se uma redução progressiva da participação dos grupos protegidos no percentual de mortes.

Em junho de 2020, idosos com 60 anos ou mais somavam 77% dos óbitos por covid-19 cadastrados no Registro Civil. A faixa etária mais atingida era dos 70 a 79 anos, com uma a cada quatro mortes (25,5%).

Em junho deste ano, a pirâmide desceu. As faixas de 60 anos ou mais tornaram-se minoria (45,7%). O intervalo de idade com mais registros mudou, então, para 50 a 59 anos, que ainda estava em processo de vacinação, com 27% dos óbitos. A taxa caiu faixa de 25,5% para 13,6% entre pessoas com 70 a 79 anos, praticamente todas imunizadas.

Gráfico mortes por covid - Arte/UOL - Arte/UOL

Imagem: Arte/UOL

Certamente é um indício bem forte de que a vacinação está fazendo exatamente o que nós esperávamos que ela fizesse: diminuísse em especial o número de óbitos entre os grupos imunizados. No Brasil, já podemos ver isso com mais clareza, como acompanhamos antes em outros países.Monica de Bolle, professora da Universidade Johns Hopkins (EUA)

A queda também é observada nos boletins epidemiológicos divulgados pelo Ministério da Saúde. Em 2020, idosos com 60 anos ou mais representaram 73% das mortes por SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave). Em 2021, até o meio de junho, o índice caiu para 60%.

A tendência é que este percentual caia ainda mais à medida que a população entre 60 e 69 anos seja completamente imunizada. Segundo o Vacinômetro do Ministério da Saúde, até o fim de junho, cerca de 60% deste grupo havia tomado as duas doses ou dose única. Nas faixas acima de 70 anos, a incidência sobe para quase 90%.

O óbito é a última fronteira. Os pacientes ficam internados, em média, um mês antes de falecerem. Então, ainda tem um alto número de mortes nesta faixa [60 a 69 anos] que nem chegou a tomar vacina ou que foi infectado na janela de imunização. Agora que vacinamos quase todos, em breve com a segunda dose, devemos ver a queda expressiva também entre eles.Paulo Menezes, coordenador do Centro de Contingência do Coronavírus em São Paulo

Se analisadas apenas as faixas de 70 anos para cima (quase 90% da população imunizada), em 2020 elas representaram 51% dos óbitos por SRAG. Neste ano, são 40%.

Em São Paulo, o Centro de Contingência acompanhou números parecidos, com redução tanto na proporção de óbitos quanto na de internações, na comparação com o início do ano, pré-vacinação.

Indicadores de pacientes com 60+ em São Paulo - Arte/UOL - Arte/UOL

Imagem: Arte/UOL

"Hoje, pessoas de 50 a 59 anos estão respondendo por 27% de todos os óbitos. Essas pessoas acabaram de ser imunizadas com a primeira dose. Então, daqui para frente, eu espero ver uma redução progressiva no número de pessoas que vão a óbito. Mas demora algumas semanas, pelo menos duas", afirma Menezes.

A diminuição das mortes entre as faixas etárias superiores impacta nos indicadores do país como um todo. Na última quinta (1º), o Brasil registrou a menor média móvel de mortes por covid em 115 dias, desde 8 de março. Na sexta, todas as regiões apontavam tendência de queda, o que não acontecia desde maio.

"Com certeza é impacto da vacinação. Já estão aparecendo diversos estudos, como o da Universidade de Pelotas [UFPel], que mostram isso. Porque [60+] era o grupo com maior mortalidade e com consequências graves da doença. Quando você diminui os casos entre eles, tem efeito direto no todo", afirma o imunologista Juarez Cunha, presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).

Idoso recebe a primeira dose da vacina contra a covid-19 na Neo Química Arena, em Itaquera - Rivaldo Gomes/Folhapress - Rivaldo Gomes/Folhapress
Idoso recebe a primeira dose da vacina contra a covid-19 na Neo Química Arena, em Itaquera
Imagem: Rivaldo Gomes/Folhapress

O estudo feito pela UFPel em parceria com a Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, aponta que a vacinação contra a covid-19 evitou a morte de mais de 43 mil idosos de 70 a 79 anos no Brasil.

Os cientistas estimaram que o avanço das imunizações seja o fator responsável pela prevenção dos números de óbitos em um intervalo de 13 semanas, com declínio progressivo na proporção de mortes pela doença. Naquela faixa, caiu de 28% para 16%. Entre os idosos com mais de 80 anos, de 28% para 12%.

Outro estudo feito pelo Instituto Butantan em Serrana, no interior de São Paulo, para testar a eficácia da CoronaVac também revelou dados animadores. Pouco mais de 95% dos adultos da cidade foram vacinados entre fevereiro e abril.

Em junho, a cidade teve quedas de 86% nas internações e de 81% em casos sintomáticos. O número de mortes caiu de 18, em maço, para 6 — dois deles, no entanto, não tinham tomado a vacina.

Média móvel de mortes em 3 de julho - UOL - UOL
Média móvel de mortes em 3 de julho
Imagem: UOL

Pandemia segue em curso e variantes preocupam

Os pesquisadores alertam, no entanto, que a pandemia segue em patamares altos no Brasil e que, mesmo com os avanços da vacinação, uma nova onda de altas nos indicadores não pode ser descartada. Apesar da queda, o índice diário de mortes segue superior a mil há 164 dias.

Tomei vacina, significa que eu posso liberar geral? Não. Pessoas vacinadas podem ter carga viral muito alta. As chances de casos graves e óbitos diminuem, mas ainda existem. Então, os recados continuam os mesmos: continuar usando máscara, fazendo distanciamento social e evitando aglomerações."Juarez Cunha, presidente da SBIm

O imunologista lembra que esses cuidados devem ser reforçados em especial com a circulação da variante Delta, identificada inicialmente na Índia, no Brasil. "É uma mutação com altíssimo índice de contaminação — e, hoje, vemos que uma variante que transmite com muita facilidade é até mais perigosa que uma mais letal. É só ver Manaus, que colapsou com a P.1 [Gamma]."

"Parte das vacinas já apontaram eficácia para esta variante. Da CoronaVac, ainda não temos, mas tudo indica que também seja eficaz. Ainda assim, é muito preocupante. Há estados aqui [nos EUA] em que ela se tornou responsável por 90% da contaminação da população não vacinada. É mais transmissível que a P.1? Não sabemos, mas é alarmante", afirma de Bolle.

Escolher a marca da vacina, prática que tem se popularizado nas capitais, também preocupa os pesquisadores. Os governos estaduais têm investido em campanhas e municípios estão tomando medidas para evitar os chamados "sommeliers de vacina".

Agora que a situação melhorou um pouco em termos de disponibilidade de doses, a mensagem é: se vacine com a vacina disponível. Essa história de querer escolher a vacina complica muito a estratégia de imunização, prejudica o todo, porque é uma pessoa imunizada a menos, e também deixa as próprias pessoas desprotegidas."Monica de Bolle, professora da Universidade Johns Hopkins (EUA)

"Estamos na reta final. Os indicadores estão melhorando e apostamos que, quanto mais a vacinação adentrar em novas faixas etárias, melhor ficará. Mas isso não significa que acabou. Os cuidados seguem - inclusive para que acabe mais rápido", conclui Paulo Menezes.

Fonte: UOL