O ministro Paulo Guedes (Economia) admitiu nesta sexta-feira (10) para investidores estrangeiros que a crise institucional, alimentada pelo presidente Jair Bolsonaro, pode prejudicar a economia do país.
“Todo esse barulho sobre instituições e democracia pode afetar nossa bem posicionada economia, no sentido de que estamos prontos para avançar novamente? Minha resposta é que isso pode produzir muito barulho, desacelerar o crescimento. Mas não mudar a direção [da política econômica], estamos na direção correta”, disse o ministro em conversa com o banco Credit Suisse transmitida pela internet para pessoas cadastradas.
O ministro afirmou mais cedo que o presidente pode ter passado dos limites em palavras, mas não em ações, e que a nota do presidente na quinta-feira (9) para acalmar os ânimos colocou "tudo de volta aos trilhos".
As declarações do ministro foram dadas após questionamentos de investidores sobre o comportamento de Bolsonaro, após o presidente ter ameaçado o STF (Supremo Tribunal Federal) no 7 de Setembro e gerado temor no mercado sobre uma possível ruptura institucional no país –o que derrubou a Bolsa, desvalorizou o real e elevou os juros no curto e no longo prazo.
O efeito mais imediato das declarações de Bolsonaro para a agenda econômica foi o bloqueio da negociação com o STF para flexibilizar o pagamento de R$ 89,1 bilhões em precatórios previstos para 2022 – o que Guedes chama de “meteoro”.
Conforme mostrou a Folha, articuladores afirmam que, mesmo com disposição para dialogar, não há clima para discutir a proposta –a principal prioridade do ministro Paulo Guedes (Economia) neste momento, ao lado do Auxílio Brasil (o novo Bolsa Família)
“Quando o meteoro veio, nós precisávamos de um tratamento especial. Eu pedi imediatamente ajuda ao STF”, disse Guedes nesta sexta. “Eles estavam nos ajudando, quando esse barulho veio e agora estamos de volta ao mesmo lugar de antes”, afirmou o ministro.
Guedes afirmou que vai voltar a conversar com o Congresso e o próprio STF na semana que vem porque o governo precisa de uma solução para enfrentar os precatórios e não descumprir o teto de gastos (norma constitucional que impede o crescimento real das despesas federais).
"Nós vamos falar com o STF e o Congresso na segunda-feira e imediatamente depois disso está [como prioridade a ser negociada] a reforma tributária", afirmou Guedes. A proposta do governo que altera o Imposto de Renda foi aprovada pela Câmara e agora depende do Senado, que sinaliza resistências ao texto.
Os questionamentos de investidores a Guedes são feitos em um momento em que o presidente insiste em tensionar a relação com os poderes enquanto é observada uma deterioração nas expetativas do mercado em diferentes indicadores —como inflação, juros e crescimento do país.
Nesta semana, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) quebrou um recorde de 21 anos para meses de agosto e chegou a 9,86% no acumulado de 12 meses.
Guedes reconheceu que a escalada nos preços é uma “sombra” que paira sobre o governo. “A sombra da escalda de inflação está sobre nós neste momento. Acho que estamos no pior momento da inflação. Acho que vai começar a desacelerar gradualmente e encerrar o ano em volta de 8%. Entre 7,5% e 8%”, disse.
Com isso, a inflação deve fechar o ano acima da meta a ser perseguida pelo Banco Central –de 3,75%, com margem de tolerância de até 5,25%.
Para o ministro, há medidas a serem tomadas sobre o assunto. Ele citou especificamente a abertura comercial, para facilitar que produtos estrangeiros entrem no país. “É um bom momento para abrirmos a economia, isso vai ajudar um pouco a controlar a escalada nos preços”, disse.
“A queda de popularidade de Bolsonaro não vem de tendências ideológicas. A credibilidade do presidente foi caindo e a confiança diminuiu bastante desde o aumento da inflação”, destacou o CEO AP Exata, Sergio Denicoli, durante a apresentação virtual dos principais dados da pesquisa Modalmais-Exata, nesta sexta-feira (10/9). Ele reforçou esse resultado está relacionado com a piora da economia, de forma geral, e se isso persistir em 2022, as chances de reeleição diminuem. Mas, se houver melhora na conjuntura econômica, o cenário ficará favorável para o chefe do Executivo.
De acordo com Denicoli, a confiança no presidente vem atrás dos sentimentos de tristeza e raiva, e, quando se perde a credibilidade de uma fatia da população que perde poder econômico, é mais difícil recuperar essa confiança perdida. “O presidente vai ter que trabalhar a economia para poder recuperar essa confiança”, afirmou.
“Esta semana intensamente política, pautas de reformas e recuperação econômica ficaram em suspenso. A inflação de agosto veio acima do esperado, puxada pela alta da gasolina. Internautas continuam reclamando dos preços de alimentos, gás, combustíveis e energia”, destacou o documento. “O consenso nas redes é de que a inflação real já ultrapassou os dois dígitos há muito tempo. Desemprego e fome são outras preocupações dos internautas e constantemente usadas pela oposição para atacar o governo e o ministro da Economia, Paulo Guedes”, acrescentou.
Na avaliação do executivo, atualmente, inflação e emprego são as principais preocupações dos internautas nas redes quando o assunto está relacionado às eleições. Contudo, devido ao recente atraso no fornecimento de vacinas contra a covid-19, o tema saúde deverá voltar entre as prioridades.
Conforme os dados da pesquisa, a popularidade de Bolsonaro chegou a cair 3% com o recuo dos ataques feitos nas manifestações de 7 de Setembro com a divulgação da carta pacificadora, “mas se recuperou em menos de 12 horas”.
O levantamento mostra ainda que as menções positivas a Bolsonaro nas redes sociais variam entre 30% e 40%, patamar que não foi ultrapassado mesmo durante as manifestações pró-governo em 7 de Setembro. Antes da saída do governo do ex-juiz Sergio Moro, em abril de 2020, essa taxa girava em torno de 50%. Naquela época, o executivo lembrou que a popularidade chegou a cair 10% e levou dois dias para voltar ao patamar anterior.
Denicoli avaliou que, ao contrário do que afirmou a oposição, as manifestações de 7 de Setembro não floparam. Para ele, os eventos mostraram que Bolsonaro tem grande capacidade de mobilização e o grande diferencial das manifestações foi concentrar pessoas de outros estados em Brasília e na Avenida Paulista, em São Paulo, que eram os locais com a participação do chefe do Executivo. “O presidente conseguiu mobilizar muito bem os convertidos mas não conseguiu sair da bolha”, afirmou.
“Acredito que a movimentação serviu para mostrar ao país que Bolsonaro é capaz de mobilizar forças que podem criar um certo caos ao país”, disse. Para ele, Bolsonaro deverá reduzir as ameaças ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas deverá manter o discurso de fraude eleitoral, porque ele insiste em afirmar que não confia nas urnas eletrônicas.
Fonte: Folha - Correio Braziliense