Política

Guedes diz que dólar deveria estar descendo, mas barulho político não deixa





Ministro afirma que câmbio de equilíbrio deveria estar entre R$ 3,80 e R$ 4,20

O ministro Paulo Guedes (Economia) afirmou que o dólar deveria estar descendo, mas isso não ocorre porque o “barulho político” não deixa. Segundo ele, o câmbio de equilíbrio no país deveria ser entre R$ 3,80 e R$ 4,20.

Como mostrou a Folha, membros do Ministério da Economia vinham demonstrando preocupação com a radicalização de discursos do presidente Jair Bolsonaro, sob a avaliação de que os ataques feitos pelo mandatário impactam indicadores econômicos e o dólar, atingem diretamente a população e dificultam a retomada da atividade. Analistas de mercado compartilham dessa avaliação.

Em evento do BTG Pactual, Guedes disse que “os atores cometem excessos”, citando como exemplo Bolsonaro e ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Para ele, o dólar deveria estar em outra trajetória.

“Estamos indo para meio trilhão de dólares de corrente de comércio com o mundo, nunca aconteceu antes, US$ 100 bilhões na balança comercial, nunca aconteceu antes. […] Então, esse dólar já era para estar descendo mesmo, mas o barulho político não deixa descer”, disse.

“Não tem problema. Mais tempo para as exportações, para nossa substituição de importações ir funcionando. Não tem problema, não temos pressa, o negócio é fazer a coisa certa”, afirmou.

Segundo o ministro, o atual governo corrigiu fundamentos da economia ao alterar a trajetória de gastos públicos. Segundo ele, esse cenário levaria os juros a patamares mais baixos e o dólar a um valor um pouco mais alto. Para o ministro, no entanto, esse valor de equilíbrio deveria ser mais baixo atualmente.

“O câmbio de equilíbrio devia ser hoje uns R$ 4,00, R$ 3,80 se estivesse tudo normal”, disse.

Nesta terça, a moeda americana operou em R$ 5,25.

No evento, Guedes afirmou que a democracia brasileira é resiliente e sofisticada. Para ele, as instituições são robustas o suficiente para corrigirem excessos.

“Os atores cometem excessos, às vezes o presidente sai do cercado, às vezes um ministro do STF prende pessoas, toda hora tem um que pula fora da cerca, dá um passeio no lado selvagem. O que acontece? As instituições se aperfeiçoam e convidam o cidadão a voltar para o cercadinho. São robustas as instituições”, afirmou.

Guedes levou a plateia do evento aos risos ao afirmar que se tornou uma força moderadora.

“Eu era um cara agitado. Nunca pensei que, por falta de serenidade, eu fosse virar o sujeito moderado. Eu sou hoje uma força moderadora, estou impressionadíssimo, acho que estou muito velho”, disse.

“Pelo amor de Deus, faltam dez meses para uma eleição. Nós vamos inventar o que agora? O presidente tem apoio popular grande e não cruzou a linha, obedeceu todas as instruções”, completou o ministro.

Guedes ainda sinalizou que o governo pode ser forçado a prorrogar novamente o auxílio emergencial se o Congresso não aprovar a reforma do Imposto de Renda. Isso porque o projeto é usado como fonte de compensação para o reajuste do Bolsa Família.

O ministro, porém, se posicionou contra a ideia. "Eu não estou lá para fazer bagunça. E vai virar bagunça se não tiver uma solução tecnicamente correta", disse.

Na avaliação de membros do Ministério da Economia, a falta de confiança no país vem afastando investimentos e pressionando a moeda americana.

O dólar em patamar elevado empurra para cima a inflação, colaborando para que o preço dos alimentos nos mercados fique mais alto. O problema é tratado como uma das principais fragilidades do governo, podendo afetar a popularidade do presidente em ano eleitoral.

Esse efeito ocorre porque diversos produtos consumidos em grande escala no país são precificados em dólar, como carne, açúcar, café e óleo de soja, além de combustíveis. O dólar mais alto também encarece o que o Brasil importa, como componentes eletrônicos e insumos agrícolas.

A turbulência gerada pelas dúvidas em relação à condução do governo ainda pressiona para cima os juros de mercado, o que encarece o crédito às famílias e o financiamento das empresas, além de ampliar o custo de administração da dívida pública pelo governo.

O Brasil vem sofrendo uma queda no ingresso de investimentos estrangeirosprodutivos, e até empresas brasileiras evitam trazer ao país dólares obtidos em exportações, que cresceram muito nos últimos meses.

A nova tendência engrossa o que vem sendo chamado de “custo Bolsonaro”. Ele é identificado como a transmissão para a economia da instabilidade política alimentada pelo presidente Jair Bolsonaro, com declarações golpistas, confronto com outros Poderes e questionamentos sobre o processo eleitoral.

O resultado tem sido a deterioração de indicadores financeiros (índice Bovespa, dólar, inflação e juros futuros) e, mais recentemente, a paralisação dos planos de investidores estrangeiros e locais de ampliar a produção e o emprego no Brasil.

Cálculos feitos em agosto pelo economista Livio Ribeiro, do Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), já apontavam que os fundamentos econômicos do Brasil, sobretudo por causa das contas externas equilibradas, não justificam o dólar acima de R$ 5,00.

As contas do economista apontavam para um patamar próximo ao mencionado nesta terça por Guedes. Pelo cálculo, sem “o gol contra da bagunça institucional” atual, a moeda norte-americana poderia valer ao redor de R$ 4,20.

No evento, Guedes voltou a criticar economistas que, para ele, têm visão pessimista sobre o país. O ministro afirmou que há um discurso de “profecia do fim do mundo” de pessoas que fazem uma “rolagem da desgraça”

Segundo ele, especialistas apostaram em uma queda mais forte da economia no ano passado e erraram, depois projetaram que a atividade não se recuperaria em 2021 e erraram. Agora, para Guedes, essas pessoas estão empurrando as estimativas negativas para 2022.

Prioridade zero é Bolsa Família de R$ 300, diz ministro

- Paulo Guedes garantiu que programa respeitará teto de gastos

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o governo tem como “prioridade zero” a efetivação do Bolsa Família com valor de R$ 300. De acordo com ele, os recursos do programa social serão bancados com recursos advindos do imposto de renda e estarão dentro do teto de gastos do governo federal.

“A agenda, prioridade zero, é Bolsa Família de R$ 300. O presidente [da República, Jair Bolsonaro] já disse que é R$ 300, dentro do teto e com responsabilidade fiscal”, disse o ministro no evento Macro Day, promovido pelo banco BTG Pactual, na capital paulista.

Em sua fala, Guedes criticou segmentos empresariais que são contrários à reforma tributária do imposto de renda. “Inadvertidamente, às vezes, o mundo empresarial vai a Brasília, e faz um lobby contra o imposto de renda. Ele, na verdade, está inviabilizando o Bolsa Família”, ressaltou.

“[Isso] vai produzir uma reação do governo que é a seguinte: então quer dizer que não tem fonte [de receita para Bolsa Família]? Não tem tu, vai tu mesmo. Então bota aí R$ 500 logo de uma vez e é auxílio emergencial. A pandemia está aí, a pobreza está muito grande, vamos embora”, acrescentou.

Essa solução, segundo Guedes, seria, no entanto, “um problema tremendo para todo mundo”. “Inclusive para quem vos fala no momento. Eu não estou lá para fazer bagunça. E vai virar bagunça se não houver uma solução tecnicamente correta”, disse. 

Fonte: Folha - Agência Brasil