Política

CPI vê novos indícios de omissão da CGU na pandemia após ouvir ministro bolsonarista





Wagner Rosário rebate acusações e diz não ter havido superfaturamento na compra da Covaxin pelo Ministério da Saúde

Os senadores da CPI da Covid questionaram durante depoimento nesta terça-feira (21) o ministro Wagner Rosário, da CGU (Controladoria-Geral da União), por não ter interrompido contratos com fortes indícios de irregularidades e apontaram omissão do órgão durante a pandemia.

Rosário, por sua vez, rebateu acusações de prevaricação, afirmou que não houve superfaturamento na compra da vacina indiana Covaxin pelo governo Jair Bolsonaro e que ficou sabendo de irregularidades no negócio, intermediado pela Precisa Medicamentos, pela imprensa em junho.

O depoimento ainda foi marcado por diversos momentos de tensão e bate-boca, inclusive envolvendo o ministro. O presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), chegou a afirmar que Rosário era “petulante pra caralho”, em áudio vazado.

Rosário foi convocado inicialmente para tratar das investigações dos repasses federais para estados e municípios. Desde o início das atividades da CPI, os senadores governistas buscam tirar o foco das ações do governo Bolsonaro e apurar fatos relativos a outros entes federativos.

No entanto, em um depoimento na semana passada, o lobista Marconny Albernaz de Faria, que atuaria em favor da Precisa, disse que foi alvo de uma operação de forças de segurança, da qual a CGU também participou. Aziz então acusou o ministro de ter prevaricado.

“A CGU, do Wagner Rosário, participou dessa coisa. Teve acesso a tudo isso e a todas essas informações. Então, Wagner Rosário é um prevaricador, tem que vir aqui mesmo, porque, como ele sabia que o [ex-diretor da Saúde] Roberto Dias estava operando dentro do ministério, e não tomou providência?”, questionou Aziz, na ocasião.

Logo na abertura de seu depoimento, Rosário buscou rebater a acusação de prevaricação, afirmando que não tinha conhecimento das informações das operações realizadas no Pará, no Instituto Evandro Chagas, que teve Marconny como um dos alvos.

“Pelo fato de a Operação Hospedeiro correr e ainda permanecer em segredo de justiça, a praxe da CGU é que os dados sejam mantidos única e exclusivamente com os servidores envolvidos diretamente na investigação”, afirmou, argumentando que essa é uma forma de evitar vazamentos de informações.

O lobista é acusado de atuar em favor da Precisa Medicamentos, em particular na intermediação da venda de testes para detectar a Covid-19. A Precisa também entrou no foco da CPI por causa da Covaxin, cujo contrato acabou cancelado após o surgimento de diversas irregularidades.

Rosário afirmou que tomou conhecimento das irregularidades no fim de junho, através de denúncias na imprensa. E apenas em julho passou a ter dados da investigação do Pará.

"No final de junho, começaram a aparecer na mídia notícias sobre o envolvimento da Precisa Medicamentos em suspeitas de irregularidades no contrato da Covaxin. Devido a isso e graças à atenção dos servidores da CGU envolvidos na investigação, o MPF solicitou ao juízo da operação o compartilhamento das informações apartadas dos autos com o MPF do Distrito Federal", afirmou.

Rosário negou que tenha havido superfaturamento na compra da Covaxin, simplesmente porque o contrato não foi executado e não teve pagamentos. Disse também que o relatório da controladoria, que recomendou a suspensão do contrato e não o seu cancelamento, apontou que o preço praticado era inferior ao cobrado pela indiana Bharat Biotech no mercado internacional.

O ministro também disse que usou o site da Precisa para obter a referência de preços das vacinas. A fala foi duramente questionada pelos membros da comissão.

“Teria sido melhor que a CGU se abstivesse de opinar. O parâmetro que ela utilizou foi o site da Precisa. Para uma CGU, é uma coisa absolutamente ridícula, covarde, utilizar como parâmetro de preço exatamente da aquisição da vacina mais cara, superfaturada, cheia de irregularidade, de documentos falsificados, o site da empresa”, afirmou o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL).

Os senadores questionaram em diversos momentos por que Rosário não recomendou a suspensão de contratos com suspeitas de irregularidades. O ministro, invertendo a lógica, questionou repetidamente os senadores para que apresentassem documentos que mostram que ele mandou prosseguir os processos.

“Por que a CGU, então, mesmo tendo identificado irregularidade na procuração utilizada pela Precisa, uma preliminar, portanto, um pressuposto, considerou o contrato regular? Por que não condenou, de pronto, a Precisa, em função da irregularidade constatada?”, indagou Renan.

“Porque ninguém pode ser condenado de pronto no direito brasileiro, senador, porque nós temos uma coisa chamada devido processo legal. Toda vez que identificamos um problema, partimos para a investigação”, respondeu o ministro.

Renan em seguida ironizou que não fica bem no “papel de apontar as suas contradições”, o que gerou um início de tumulto na sessão.

Os membros da comissão reclamaram diversas vezes da postura “arrogante” e “petulante” do ministro. O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), num momento em que presidia a sessão, chegou a reprimir o depoente. “O senhor respeite esta Casa, por favor. Baixe a bola”, disse.

Em outro momento, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), apresentou mensagens, em posse da CGU, que mostram contato do lobista Marconny com outros agentes ligados a irregularidades no Ministério da Saúde. O senador questionou por que Rosário não tomou providências, que começou a fazer perguntas a Randolfe, o que foi novamente interpretado como petulância.

AMEAÇA DE RENAN BOLSONARO

Antes do início do depoimento, senadores reagiram ao vídeo de Jair Renan Bolsonaro, filho mais novo do presidente da República, Jair Bolsonaro, no qual mostra armas de fogo e envia um "recado" para a CPI.

Ele postou em suas redes sociais um vídeo no qual afirma estar visitando uma loja de armas. Jair Renan gravou um mostruário de pistolas e chamou os itens de "brinquedo". Rindo e filmando os trabalhadores da loja, o filho de Bolsonaro falou: "Alô, CPI".

Aziz chamou o filho do presidente de marginal. "Quem tem esse linguajar é marginal. É marginal que chama arma de fogo de brinquedo."

O presidente da CPI ainda afirmou que teve uma conversa com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que teria prometido que a Casa tomaria as medidas cabíveis.

"Hoje de manhã conversei com o presidente Rodrigo Pacheco e ele pediu para transmitir essa mensagem. Disse que está 100% solidário à CPI, que esse tipo de absurdo não pode acontecer e que ele, como presidente do Senado, vai tomar todas as decisões cabíveis contra esse tipo de ameaça que a CPI recebe", relatou Aziz.

"É mais um filho do presidente que não recebeu educação dele", afirmou Renan Calheiros. "Essas ameaças de um fedelho como esse não vão intimidar a comissão parlamentar de inquérito."

Randolfe sugeriu que Jair Renan fosse denunciado pelo crime de ameaça.

“Não houve superfaturamento”, diz Wagner Rosário sobre Covaxin

O ministro-chefe da CGU (Controladoria-Geral da União), Wagner Rosário, afirmou que não houve superfaturamento no caso da Covaxin. Em depoimento à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid no Senado, o ministro afirmou que o superfaturamento só ocorre se houvesse o pagamento com valores acima dos praticados no mercado.

Nesse caso, não teve a contratação efetivamente e, por óbvio, não houve pagamento. Então afirmo que não houve superfaturamento no contrato”, disse Rosário.

A tentativa da empresa brasileira Precisa Medicamentos de vender a Covaxin, fabricada pela Bharat Biotech, ao Ministério da Saúde é um dos focos da CPI da Covid.

O deputado Luis Miranda (DEM-DF) e o irmão dele, o servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, apresentaram aos senadores supostas irregularidades no contrato da Covaxin. Afirmaram que houve pressões internas no ministério para que a compra da vacina fosse aprovada.

O sobrepreço na contratação, ou seja, um preço maior no contrato, ainda que ainda não pago, também foi questionado pelo relator da CPI da Covid, senador Renan Calheiros (MDB-AL). Mas, segundo Rosário, o valor acima do mercado não teria existido, segundo o ministro do CGU.

Também não identificamos [sobrepreço]. Fizemos contato com a própria empresa, a Bharat Biotech na Índia, fizemos verificações no site da própria empresa”, disse o ministro. “O preço que a empresa vende esses produtos para outros países está em uma fase de US$ 15 a US$ 19 e nós havíamos fechado essa contratação, o governo federal, em US$ 15.”

A verificação de preços, segundo o ministro, foi realizada com consulta a empresa e ao site da farmacêutica. Mas a farmacêutica indiana não quis informar o preço praticado com cada país.

Renan criticou a forma como a consulta de preço foi realizada. Segundo o senador, não faz sentido retirar conclusões com base em informações de uma empresa que apresentou um contrato em que foram indicadas diversas irregularidades.

Rosário afirmou ainda que na ocasião a Bharat Biotech não falou nada sobre o uso de documentos falsos por parte da Precisa Medicamentos.

Em 23 de julho, a Bharat Biotech comunicou que encerrou o seu contrato com a Precisa Medicamentos. Na época a empresa não informou o motivo para rescindir o contrato com a companhia brasileira, mas afirmou que a Precisa apresentou documentos falsos ao Ministério da Saúde.

Os senadores da CPI questionaram Rosário sobre a atuação da CGU em relação às irregularidades nos documentos. Renan questionou porque o órgão não interrompeu o processo ao identificar problemas com a procuração da Precisa.

O ministro afirmou que seguiu o “devido processo legal”, ele afirmou que não determinou que o contrato continuasse. Os congressistas indicaram que a CGU não interrompeu o processo, que tinha o contrato assinado e com pedido de antecipação do pagamento.

Abrimos investigação”, disse Rosário.

CASO COVAXIN

Depois que o caso foi levado à CPI, o ministério decidiu suspender o contratode compra de 20 milhões de doses da vacina por R$ 1,6 bilhão. Segundo a pasta, a decisão foi tomada por recomendação da CGU.

MPF (Ministério Público Federal) pede investigação na esfera criminal contra o Ministério da Saúde por identificar indícios de crime de improbidade administrativa no contrato do órgão com a Precisa.

Além disso, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) está sendo investigado pela Polícia Federal pelo suposto crime de prevaricação. Ou seja, mesmo sabendo das irregularidades na compra da Covaxin, o presidente não as teria notificado às autoridades. O deputado Luis Miranda e o irmão dele afirmaram à CPI que alertaram o presidente.

Fonte: Folha - Poder360