Política

Depoente se cala e tem sigilo quebrado em sessão da CPI marcada por briga





O diretor institucional da Precisa Medicamentos, Danilo Trento, exerceu o direito ao silêncio, garantido por liminar do STF (Supremo Tribunal Federal), na maior parte do tempo durante depoimento hoje à CPI da Covid, no Senado Federal. O empresário se recusou, inclusive, a fazer juramento de dizer somente a verdade.

Parlamentares se irritaram com a esquiva de Trento e, após requerimento extra-pauta, aprovaram a quebra dos sigilos bancário, fiscal, telefônico e telemático dele e do irmão, Gustavo Trento —também empresário ligado a negócios com a Precisa Medicamentos.

O silêncio predominante do depoente ocorreu em audiência marcada por uma acalorada briga entre o relator, Renan Calheiros (MDB-AL), e o senador Jorginho Mello (PL-SC), aliado ao governo. Houve troca de xingamentos entre os dois, e acusações de "vagabundo", "picareta" e "ladrão".

Na avaliação de parlamentares da oposição, Trento acabou abusando do direito ao silêncio em alguns momentos —como quando se negou a fornecer o endereço de sua empresa. O habeas corpus do STF garante ao beneficiário o princípio da não autoincriminação, isto é, ele só pode se calar perante questionamentos que possam, de alguma forma, incriminá-lo.

Em razão da postura, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) chegou a sugerir que a presidência do colegiado avaliasse proceder com pedido de prisão contra o depoente. A ideia, no entanto, não foi acatada.

Indagado se havia participado das negociações da Precisa no caso Covaxin —a empresa foi intermediária do processo de compra da vacina indiana por parte do governo brasileiro, junto ao laboratório Bharat Biotech—, Trento respondeu que esta não era sua atribuição.

"Como diretor institucional, não participei das negociações", disse.

O empresário também foi questionado sobre ter ou não relações com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e seus familiares. Inicialmente, o depoente exerceu mais uma vez o direito de não responder. O relator então observou que o silêncio simbolizaria uma espécie de confissão.

Após o comentário de Calheiros, Trento recuou e declarou não ter qualquer tipo de vínculo com o clã Bolsonaro. "Não tenho relação com nenhum membro da família, apenas os conheço, alguns publicamente, outros em eventos", respondeu.

O diretor da Precisa também esclareceu posteriormente que participou de uma reunião de trabalho na qual estava presente o senador Flávio Bolsonaro(Patriota-RJ), filho mais velho do chefe do Executivo federal.

Sócio de dono da Precisa

Segundo o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), além de diretor institucional da Precisa, Trento é também sócio da Primarcial Holding e Participações, com sede em São Paulo e no mesmo endereço da empresa Primares Holding e Participações. As duas empresas fazem parte do grupo liderado por Francisco Maximiano, dono da Precisa.

"Recebemos também informações de que Danilo e Maximiano viajaram juntos à Índia para as negociações em torno dos testes de covid e da vacina Covaxin", disse o senador no requerimento de convocação de Trento.

Após uma série de suspeitas e denúncias de irregularidades no caso Covaxin virem à tona, o contrato para compra de 20 milhões de doses da vacina (ao custo de R$ 1,6 bilhão) foi cancelado. O acordo havia sido firmado em fevereiro desse ano.

A convocação de Danilo Trento foi aprovada na CPI em 30 de junho e 3 de agosto. Inicialmente, a comissão pretendia ouvi-lo em 16 de setembro. No entanto, ele não foi encontrado para ser notificado sobre a convocação. A notificação é um dos passos necessários para a realização do depoimento.

Citado em depoimento de lobista

Em depoimento à CPI na semana passada, o suposto lobista da Precisa Marconny Faria afirmou ter conhecido Trento como proprietário da empresa, Marconny é amigo de Jair Renan, um dos filhos do presidente Jair Bolsonaro, e suspeito de ter atuado em favor de interesses da mãe dele, Ana Cristina Valle — segunda esposa do chefe do Executivo.

A CPI apura ainda se Trento e Marconny trabalharam para tentar fraudar um processo de compra de testes rápidos de covid-19 pelo Ministério da Saúde para beneficiar a Precisa.

Alguns senadores acreditam também que Danilo Trento tenha relações comerciais com Marcos Tolentino, apontado como sócio oculto do FIB Bank — empresa escolhida pela Precisa para oferecer garantia no contrato de compra da vacina. Apesar do nome, não se trata de um banco e, de acordo com as investigações, a instituição não teria condições mínimas de arcar com a garantia oferecida.

Em 19 de agosto, por iniciativa de Renan Calheiros, a CPI aprovou requerimento ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) para entrega de relatório de inteligência financeira de Danilo Trento e da Primarcial Holding e Participações. As informações solicitadas são do período desde 2019 até agosto passado.

Segundo o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), o diretor institucional da Precisa recebeu R$ 630 mil da empresa 6M Participações, que é de Francisco Maximiano, que, por sua vez, já transferiu R$ 92 mil a Trento. Além disso, o senador afirmou que Danilo Trento já alugou jatinho em nome da 6M, e o irmão dele, Gustavo Trento, trabalha na Precisa Medicamentos, recebendo salário mensal de R$ 6 mil.

- CPI da Pandemia convoca Luciano Hang e advogada de dossiê contra Prevent Senior

Defensora vai à comissão falar sobre documento que questiona condução do tratamento de pacientes com o novo coronavírus na rede da empresa; mãe do empresário teria tido a Covid-19 omitida de declaração de óbito

Empresário Luciano Hang e sua mãeEmpresário Luciano Hang e sua mãe  

A CPI da Pandemia aprovou nesta quinta-feira (23) as convocações do empresário Luciano Hang e da advogada Bruna Morato, que representa um grupo de médicos que produziram um dossiê com informações sobre possíveis irregularidades na operadora de saúde Prevent Senior.

A defensora será ouvida na terça-feira (28), às 10h, representando os 12 médicos que fazem a denúncia contra a empresa. O empresário, dono da rede de lojas Havan, será ouvido no dia seguinte, quarta-feira (29), no mesmo horário.

A ida da advogada à comissão foi antecipada pelo analista de política da CNNGustavo Uribe, que informou que a própria profissional foi quem procurou o presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM), para se oferecer a prestar depoimento.

O dossiê apresentado pelos clientes de Bruna Morato aponta supostas irregularidades na condução do tratamento de pacientes com a Covid-19 na rede da Prevent Senior. Uma das irregularidades seria a omissão da doença do novo coronavírus no atestado de óbito de diversos pacientes, entre eles o pediatra Anthony Wong e Regina Hang, a mãe do empresário Luciano Hang.

O documento ainda inclui a acusação de que a Prevent Senior teria conduzido de forma irregular estudos sobre o uso do chamado “Kit Covid”, com medicamentos sem eficácia comprovada para tratar a doença do novo coronavírus. A empresa é suspeita de ter ministrado os medicamentos sem autorização de parte dos familiares e de ter ocultado o uso do tratamento em pacientes que morreram após contrair a Covid-19.

Em depoimento à CPI, o diretor-executivo da empresa, Pedro Batista Júnior, admitiu que a Prevent Senior orientou médicos a alterarem o CID — o código utilizado mundialmente para identificar e diferenciar as doenças — de pacientes com Covid-19 após um período de internação, o que teria resultado em um número subdimensionado de mortes em razão da doença na rede da empresa.

Batista Júnior, no entanto, negou as irregularidades no estudo, acusou revanchismo de ex-colaboradores da empresa e defendeu a política de alterar o CID, argumentando que após o período previsto pela Prevent — de 14 dias em enfermaria ou 21 dias em UTI — as mortes não deveriam ser atribuídas à Covid-19.

- Advogada diz a CPI da Pandemia que Prevent Senior promoveu novas demissões

Em áudio, a advogada Bruna Morato informou que a operadora de saúde afastou nesta quarta-feira (22) quatro médicos, entre eles um dos que teria colaborado com dossiê.

Hospital da rede Prevent Senior em São Paulo (SP) 17/03/2020Hospital da rede Prevent Senior em São Paulo 

Em áudio enviado à CPI da Pandemia, a advogada Bruna Morato informou que a Prevent Senior demitiu nesta quarta-feira (22) quatro médicos, entre eles um dos clientes da profissional, que contribuiu com a elaboração de dossiê contra a operadora de saúde.

CNN teve acesso à mensagem. No conteúdo, a advogada também se oferece para prestar depoimento à comissão de inquérito, inquirição que deve ser realizada na próxima semana.

As demissões teriam ocorrido no mesmo dia do depoimento à CPI da Pandemia do diretor da empresa Pedro Batista, que negou os indícios de irregularidades apontados no dossiê.

Procurada pela CNN, a Prevent Senior informou que a operadora de saúde “tem 12 mil funcionários e 3 mil médicos” e que “desligamentos e contratações são diários”.

“Politizar o departamento pessoal da empresa reflete o desespero de quem faz denúncias que serão desmascaradas”, ressaltou.

No áudio, a advogada afirmou que está disponível para prestar depoimento “caso nenhum médico queira ir” e que o que aconteceu na CPI da Pandemia “foi muito bom”.

“Ele [Pedro Batista] disse que a instituição deu toda autonomia e que, se aconteceram mortes, a culpa é dos médicos. E saíram de lá demitindo médicos, demitindo diretor”, afirmou.

O presidente da CPI da Pandemia, Omar Aziz (PSD-AM), afirmou à CNN que deve aprovar na sessão desta quinta-feira (23) o requerimento para ouvir a advogada na próxima semana.

O dossiê apresentado por 12 médicos e ex-médicos da Prevent Senior à CPI da Pandemia, ao qual a CNN teve acesso, afirma que as declarações de óbito do médico Anthony Wong e da mãe do empresário Luciano Hang foram fraudadas.

Wong era defensor do tratamento precoce. Segundo o dossiê, ele faleceu em um hospital da rede da Prevent por complicações da Covid-19. Na oitiva da quarta-feira (22), o diretor da Prevent Senior, Pedro Batista, confirmou que atendeu Anthony Wong: “Ele me ligou pessoalmente procurando atendimento, disse que ele não estava bem”.

Porém, Batista se negou a revelar a causa da morte. “Tenho proibição expressa da família para não comentar dados sobre pacientes”, afirmou.

Outro caso questionado na sessão é sobre a mãe do empresário Luciano Hang, próximo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Em vídeo apresentado na CPI, Hang diz que se arrepende de não ter levado sua mãe para fazer o chamado “tratamento precoce”.

Pedro Batista confirmou, na oitiva da CPI da Pandemia, que Regina Hang foi internada em hospital da Prevent Senior, mas não quis detalhar o atendimento.

Fonte: UOL com Agência Senado - CNN Brasil