O STF (Supremo Tribunal Federal) guarda na cobertura de um de seus anexos um gabinete fantasma. Com 484 metros quadrados, o espaço era ocupado pelo ministro Marco Aurélio Mello, que se aposentou em 12 de julho. Dormem no gabinete 1.105 processos - que, sem um novo relator, estão com o andamento paralisado.
O local sofreu uma espécie de debandada recentemente. Dos cerca de 20 servidores, ao menos metade foi transferida para o gabinete do ministro Kassio Nunes Marques, que tomou posse em novembro do ano passado. O novato aguardou a aposentadoria do colega e convidou os funcionários para trabalhar com ele. Queria pessoas com experiência no Supremo.
Para completar o cenário, o gabinete que antes pertenceu a Marco Aurélio está em obras. Depois que tudo estiver pronto, a ministra Cármen Lúcia será a nova inquilina. O gabinete tem salas amplas, iluminação natural e conta com um jardim de inverno. Cármen Lúcia será vizinha de Gilmar Mendes, que ocupa o outro gabinete da cobertura.
Cármen Lúcia herdará apenas o espaço físico. Os processos de Marco Aurélio serão transferidos para o gabinete atual da ministra - que, por sua vez, será ocupado pelo novo integrante do tribunal. Se André Mendonça for aprovado na sabatina da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, a vaga será dele.
Passados dois meses e meio da aposentadoria de Marco Aurélio, ainda não se sabe quando o novo ocupante da vaga tomará posse. O presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (DEM-AP), segue relutante para agendar a sabatina.
Embora seja uma longa espera, não é a maior de que o Supremo tem notícia. Quando Joaquim Barbosa se aposentou, em 2014, levou nove meses para seu substituto, Edson Fachin, tomar posse. A demora, na ocasião, não foi para a realização da sabatina, mas para a então presidente, Dilma Rousseff, escolher o novo ministro.
O acervo deixado por Marco Aurélio é dos menores do STF. Têm menos processos que ele apenas Alexandre de Moraes, com 703, e Cármen Lúcia, com 864. O ministro com maior número de processos aguardando julgamento é o presidente, Luiz Fux, com 4.217. Em seguida vem Fachin, com 2.546.
Entre os processos que serão herdados pelo novo ministro do STF, há casos polêmicos. Um deles é a queixa-crime ajuizada pelo senador Jaques Wagner (PT-BA) contra o presidente Jair Bolsonaro. O parlamentar acusa Bolsonaro dos seguintes crimes: perigo de contágio de moléstia grave, perigo para a vida ou saúde de outrem, infração de medida sanitária preventiva, charlatanismo e prevaricação. Os atos apontados se referem à forma como o presidente vem se portando durante a pandemia.
Em outro processo, são questionadas regras eleitorais - como o aumento dos recursos do Fundo Eleitoral de Financiamento de Campanha, a forma de atestar a inelegibilidade de um candidato e também a anistia por doações ilícitas. Até o substituto de Marco Aurélio tomar posse, essas ações ficarão paradas. Mas, se houver algum pedido urgente, o autor da ação pode pedir para Fux encaminhar o processo para outro relator.
A pressão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, para que o Senado vote a indicação de André Mendonça para a Corte incomodou colegas dele no tribunal.
Eles acreditam que Fux está em campanha pela aprovação de Mendonça por causa do perfil lavajatista do ex-advogado-geral da União, indicado ao cargo por Jair Bolsonaro.
Uma vez no STF, Mendonça se uniria a magistrados derrotados para reverter o resultado de votações sobre temas que representaram derrotas para a Lava Jato.
O principal revés institucional para a operação foi a derrota da possibilidade de prisão depois de condenação em segunda instância na Justiça. O placar foi apertado: 6 a 5. Mendonça poderia virar o jogo.
A outra decisão que contrariou os lavajatistas foi a de permitir que a Justiça Eleitoral julgue casos de corrupção nas eleições. Eles preferiam que as denúncias seguissem tramitando na Justiça Federal.
Seleção das principais notícias da semana sobre o cenário jurídico e conteúdos exclusivos com entrevistas e infográficos.
Um dos argumentos de Fux para apressar a votação no Senado é o desfalque na composição da Corte, que já duraria muito tempo e estaria emperrando o funcionamento do tribunal. Mendonça foi indicado por Bolsonaro em 13 de julho —ou pouco mais de dois meses.
No governo Dilma Rousseff, a vaga de Eros Grau, que se aposentou em agosto de 2010, ficou vaga por seis meses. O indicado para ela foi justamente Luiz Fux, depois de uma disputa acirrada nos bastidores do governo e da Justiça.
A assessoria do Supremo afirma que Fux “tinha como preferência para a Suprema Corte um juiz de carreira, do STJ. No entanto, a indicação é prerrogativa do presidente da República, que escolheu André Mendonça. Uma vez indicado, cabe ao Senado analisar. Para o ministro Fux, não é bom para o país que a sabatina seja postergada com um nome já indicado. Seja para aprovar, seja para rejeitar, cabe ao Senado deliberar”.
Fonte: UOL - Folha