Economia

Ibovespa encerra em queda de 2,75%; dólar fecha a R$ 5,66





Bolsa encerrou a 107.735,74 pontos, menor fechamento desde novembro de 2020; moeda americana disparou 1,90%

mercado financeiro reagiu nesta quinta-feira (21) à ameaça de fim do teto de gastos, depois o ministro da Economia, Paulo Guedes, sinalizar na véspera que seria conivente com despesas fora da regra para viabilizar a extensão do Bolsa Família.

Os temores se intensificaram durante a tarde após o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) prometer um auxílio a caminhoneiros.

Com isso, o Ibovespa chegou a cair 4,6% durante a tarde, aos 105.713 pontos. No fechamento, encerrou com queda de 2,75%, a 107.735,74 pontos, menor fechamento desde novembro de 2020. O volume de negócios somou R$ 43,4 bilhões.

Já o dólar spot disparou 1,51% ao,longo do dia e chegou a ser cotado a R$ 5,6814, batendo novo recorde no dia. No encerramento a cotação ficou em R$ 5,66, alta de 1,90%, nova máxima em seis meses, refletindo pânico generalizado dos mercados brasileiros com descontrole fiscal.

Na última quarta-feira (20), o ministro da Cidadania, João Roma, confirmou o Auxílio Brasil de R$ 400 para 17 milhões de famílias. Ninguém questiona a necessidade de oferecer ajuda às famílias vulneráveis nesse momento. O grande problema é que nem Roma, nem Paulo Guedes, ministro da Economia, explicaram de onde virá o dinheiro.

Ao tentar explicar, Guedes disse que pensa em duas alternativas: a primeira é um “puxadinho” de R$ 30 bilhões no teto, regra constitucional que limita os gastos públicos à inflação do ano anterior. A lei foi criada em 2016, num momento em que os gastos do governo federal ficavam 6% acima do índice oficial de preços.

A segunda é uma sincronização dos índices de inflação que corrige o limite do teto e as despesas do governo, que abriria espaço de R$ 45 bilhões. Mas o ministro não detalhou como isso seria possível.

À CNN, economistas falaram que ninguém está entendendo esse número.

Seja mudando a correção do teto, seja fazendo um puxadinho, economistas interpretam que o governo está abandonando o teto de gastos e estamos num ponto de inflexão na política econômica.

A âncora fiscal do país está deixando de existir, o que abre a porta para a escalada de gastos, o que afeta a percepção de risco, inflação, juros e dívidas.

Uma segunda leitura é que isso acontece para abrir espaço não para um programa social, mas para emendas parlamentares, num sinal de populismo.

Por fim, o relator da reforma do Imposto de Renda avalia corrigir em 41% todas as faixas da tabela do IR. Com reajuste maior, a margem para arrecadação diminui. Lembrando que o governo contava com a reforma para ter fonte de renda para o IR, mas apesar da pressão, o relator reforçou que não vai apressar o assunto.

- Dólar pode ir a R$ 6 com incerteza sobre teto de gastos, dizem analistas

 

Essa abertura da ala econômica para garantir mais recursos para garantir o Auxílio Brasil a R$ 400, e a mudança de postura de Guedes em relação ao teto geram cada vez mais incertezas no mercado, segundo economistas ouvidos pelo UOL. E se essa instabilidade permanecer por mais tempo, é possível que o dólar alcance os R$ 6 ainda neste ano.

Guedes 'jogou a toalha', diz economista

 

"Ver o Paulo Guedes falando isso [pedindo licença para gastar] dá um sinal de que cada vez mais o governo vai priorizar a eleição. Abandonar a meta fiscal, ao invés de criar nova receita e apertar o cinto do outro lado, mostra que o comprometimento fiscal não é prioritário para o governo e se não é agora, imagine como será ano que vem", afirma Paulo Duarte, economista-chefe da Valor Investimentos.

 

Para Rodrigo Marcatti, economista e CEO da Veedha Investimentos, Guedes "jogou a toalha".

 

"Nada é tão ruim que não possa piorar. Os últimos dias trouxeram várias surpresas negativas e a reação do ministro foi uma delas. O mercado sentiu mais forte essa jogada de toalha do ministro, despreocupado com o lado fiscal. Ele aceitou uma decisão política", afirma.

 

"Criaram essa narrativa de ajudar a população. Claro que a população precisa de ajuda, mas essa narrativa está sendo usada para criar uma situação favorável ao governo para a campanha eleitoral", diz.

 

Alta do dólar está na conta do cenário interno

 

Segundo os economistas ouvidos pelo UOL, a alta do dólar deve-se, prioritariamente, ao cenário interno, porque o cenário externo está favorável para o país, com preços das commodities em alta.

 

De acordo com Duarte, o cenário de dólar mais elevado é "frustrante", porque a moeda está mais enfraquecida no mundo, e poderia estar em outro patamar aqui no Brasil.

 

"O real tem ficado para trás por questões internas. Todo esse esforço do Banco Central, com ajuste da Selic [taxa de juros] para conter o IPCA [inflação], vai ter pouco efeito porque um câmbio mais precificado acaba decaindo sobre a inflação", afirma.

 

"A sensação que dá é de que o governo Bolsonaro cria as suas próprias crises, diante de uma oposição pouco atuante", diz Duarte.

 

Para Flávio de Oliveira, chefe de renda variável da Zahl Investimentos, não há nada que justifique o dólar nos patamares atuais, a não ser o estresse interno.

 

"Sem a instabilidade interna, o dólar estaria mais baixo. No pico da pandemia, o dólar foi a R$ 5,85. Estamos praticamente com o dólar próximo ao pico da pandemia, quando ninguém sabia o que aconteceria", diz.

 

Dólar entre R$ 5,40 e R$ 6, dependendo da incerteza

 

Segundo Duarte, se esse cenário de incerteza continuar, o câmbio pode se aproximar de R$ 5,80 e chegar a R$ 6, "com espaço para andar mais". Mas é possível um recuo, se houver alguns acertos políticos.

 

"Se o governo apertar o cinto e andar com as reformas, como a administrativa que ataca mais as despesas do que a reforma tributária, isso acalma os mercados, que passam a entender que o governo está trabalhando para uma situação de máximo equilíbrio. E daí a gente pode imaginar o câmbio próximo a R$ 5", afirma o economista da Valor Investimentos.

 

"Não podemos esquecer que o dólar já não estava barato. Pode furar os R$ 6? Pode. Na nossa visão, enquanto essa turbulência continuar, o dólar vai continuar subindo", afirma Oliveira, da Zahl Investimentos.

 

Victor Scalet, estrategista macro da XP, afirma que é difícil saber até onde o dólar pode chegar, "porque a gente não sabe o tamanho da deterioração ainda".

 

Até a semana passada, o nível de câmbio era próximo de R$ 5,30 e R$ 5,40, com Auxílio Brasil de R$ 300 para 17 milhões de famílias. Segundo o especialista, isso já estava incorporado pelo mercado.

 

"Não é que o mercado esperava um cumprimento das regras fiscais. Mas da semana passada para cá, essa conta de R$ 30 bilhões fora do teto agora é de 90 bilhões", afirma

 

Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, traça dois cenários. No primeiro, o risco fiscal segue elevado, com piora da dívida pública. "Nesse cenário, a tendência é de alta do dólar, podendo superar as máximas históricas", afirma.

 

No segundo cenário, há maior clareza do que o governo vai fazer, do que vai acontecer.

 

"Isso pode tranquilizar o mercado e fazer o dólar voltar ao patamar dos R$ 5,40. O dólar reage muito a notícias e talvez até a semana que vem a gente tenha mais clareza", diz.

 

Para Marcatti, independentemente da situação atual, o dólar pode não se sustentar em patamares tão elevados, se o cenário externo continuar favorável.

 

"No longo prazo, a tendência não é o dólar nesse patamar de R$ 5,80 e R$ 5,70, ainda mais com as commodities nos preços como estão. A tendência é que, passadas as notícias ruins, a gente tenha uma acomodação. Agora, se a gente continuar tendo notícia ruim atrás de notícia ruim, como uma saída do ministro, por exemplo, o dólar pode chegar a R$ 6, e pode até romper isso", afirma.

 

João Maurício Rosal, economista-chefe da Guide, afirma que é possível que a moeda chegue a R$ 6, até porque o mercado está perdendo a referência do valor justo. 

 

"É uma situação de pânico mesmo. Está havendo uma re-precificação de todos os ativos brasileiros. Isso gera distorções no mercado e movimentos de pânico em que as pessoas perdem a referência do valor justo do ativo", afirma.

 

Mesmo com acordo, incerteza pode aumentar

 

Segundo Oliveira, é possível que essa incerteza continue, apesar do possível acordo que vai garantir em torno de R$ 84 bilhões ao governo.

 

"A questão é que passamos o teto de gastos, e o que vem depois? Esse é o grande ponto. Não era nem para furar o teto e agora estamos falando de permissão para isso. Então o que vai acontecer no ano eleitoral?", diz.

 

Scalet, da XP, avalia que abrir espaço no teto agora é ampliar os gastos até 2026 —ano em que, pela Constituição, o teto poderia ser revisto — uma vez que, em pleno ano eleitoral, dificilmente Bolsonaro retirará um benefício que, hoje, diz que será temporário.

 

Segundo o anúncio feito na última quarta (20), pelo ministro da Cidadania, João Roma, a ideia é oferecer pelo menos R$ 400 de forma transitória ao longo de 2022.

 

"É difícil imaginar que qualquer político vai dizer, em um ano eleitoral, que vai diminuir ou prometer o fim desse valor. Lembrando que é preciso entregar o Orçamento de 2023 em agosto, no meio da campanha. É difícil acreditar que isso será temporário", diz.

 

"Quanto mais prolongada essa incerteza mais afeta a economia real. Afetando a economia real, a expectativa de se obter ganho no Brasil, como ações na Bolsa, torna-se ainda menos atrativo", diz Rosal.

 

Mercado pode estar antecipando 2022?

 

Segundo Oliveira, é possível que essa alta acentuada da moeda norte-americana agora reduza uma alta mais forte no ano eleitoral —quando os mercados normalmente oscilam mais.

 

"Existe uma chance de o dólar ter uma volatilidade acentuada [em 2022], mas também não descartaria um cenário de menos volatilidade, porque ela já está acontecendo hoje", afirma. 

 

Scalet, da XP, diz que as eleições estão no contexto, mas que ainda tem muita água para rolar sobre o tema.

 

"O mercado costuma operar temas, ele se ocupa de poucos temas de uma vez. O tema eleição está dado, mas não acredito que os preços estejam refletindo essa demanda ainda. A eleição está no contexto, mas não acho que o mercado já começou a operar a diferença entre os candidatos", diz.

 

- Inflação provoca alta de 14,2% na busca por crédito, aponta Serasa

Demanda foi maior entre consumidores de renda mais baixa

A busca de consumidores por crédito aumentou 14,2% em setembro no comparativo com igual período do ano passado, aponta indicador da empresa de consultoria Serasa Experian. Na análise por faixa de renda, os que recebem menos, até R$ 500, foram os que mais buscaram recursos financeiros, com alta de 21,3%. Entre os que ganham entre R$ 500 e R$ 1 mil, o aumento da procura ficou em 14,9%.

Entre os que têm maior poder aquisitivo, com renda superior a R$ 10 mil, a variação anual do indicador ficou em 11,6%. O índice é similar ao encontrado nas faixas de renda anteriores: 12,3% de alta entre os que ganham de R$ 1 mil a R$ 2 mil; 11,9% entre os que têm renda de R$ 2 mil a R$ 5 mil e alta de 11,4% para a faixa de R$ 5 mil a R$ 10 mil.

Em nota, o economista da Serasa Experian Luiz Rabi diz que a alta da inflação explica a maior busca por crédito, especialmente na população de menor renda. De acordo com Rabi, muitas vezes, o consumidor não consegue manter os recursos fixos mensais  e procura complementar a renda por meio do crédito.

Na análise por região, o Nordeste teve o aumento mais expressivo, com 21,8%. O Norte também foi um dos principais responsáveis pela alta no indicador, com 21,2%.

Embora com percentuais menores, as demais regiões também registraram aumento na demanda por crédit: Centro-Oeste, 15,3%; Sudeste, 11,8%; e Sul, 9,7%.

Fonte: CNN Brasil - UOL - Agência Brasil