Cultura

Papa aos jornalistas: a realidade é o grande antídoto para muitas 'doenças'





Ao entregar as insígnias da Grã-Cruz da Ordem Pia a dois jornalistas vaticanistas o Papa falou sobre a “missão” dos jornalistas caracterizando-a com três verbos: escutar, aprofundar, contar

Jane Nogara - Vatican News

Na manhã deste sábado, 13 de novembro, o Papa Francisco entregou as insígnias de 'Dama' e 'Cavaleiro' da Grã-Cruz da Ordem Pia a dois jornalistas vaticanistas: a senhora Valentina Alazraki e o senhor Philip Pullella que há muitos anos acompanham as notícias sobre os Papas e a Igreja. Francisco iniciou saudado-os como “companheiros de viagem” pelos inúmeros encontros no decorrer dos anos nos aviões, celebrações e encontros com peregrinos.

"A senhora Valentina Alazraki, que na sua primeira viagem - disse o Papa - muito jovem embarcou no avião que levou São João Paulo II a Puebla em 1979 e o senhor Phil Pullella, também um veterano e conhecido protagonista das informações do Vaticano. Quantas experiências compartilhadas, quantas viagens, quantos eventos”. Em seguida disse "com a menção honrosa dada a Valentina e Phil, hoje quero de alguma forma prestar homenagem a toda a sua comunidade de trabalho” que considera precioso. “O jornalismo – continuou -  não acontece escolhendo uma profissão, mas embarcando em uma missão, como um médico, que estuda e trabalha para que no mundo o mal seja curado”.

“A missão do jornalista é explicar o mundo, torná-lo menos obscuro, fazer com que as pessoas tenham menos medo e possam olhar para os outros com maior consciência, e também com mais confiança. É uma missão difícil”

“É por isso que encorajo vocês a preservar e cultivar esse sentido de missão – continuou Francisco - que está na origem de sua escolha. Faço-o com três verbos que acredito caracterizarem o bom jornalismo: escutar, aprofundar, contar.

Escutar

“Escutar é um verbo que diz respeito a vocês como jornalistas, mas também a nós como Igreja, em todos os momentos e especialmente agora que o processo sinodal já começou. Para um jornalista, escutar significa ter a paciência de encontrar-se frente a frente com as pessoas a serem entrevistadas, os protagonistas das histórias que estão sendo contadas, as fontes das quais receber as notícias.

“Escutar sempre anda de mãos dadas com ver, com estar presente: certas nuances, sensações, descrições bem fundamentadas só podem ser transmitidas aos leitores, ouvintes e espectadores se o jornalista tiver escutado e visto por si mesmo”

Aprofundar

Aprofundar, o segundo verbo, - continua Francisco - é uma consequência de escutar e ver. Cada notícia, cada fato de que falamos, cada realidade que descrevemos precisa ser investigada. Numa época em que milhões de informações estão disponíveis na web e quando muitas pessoas obtêm suas informações e formam suas opiniões nas redes sociais, onde infelizmente às vezes prevalece a lógica da simplificação e da contraposição, a contribuição mais importante que o bom jornalismo pode dar é a de um aprofundamento”.

Contar

“Por fim – explica o Papa - o terceiro verbo, contar: não preciso explicá-lo a vocês, que se tornaram jornalistas justamente porque são curiosos sobre a realidade e apaixonados por contá-la. Contar significa não se colocar em primeiro plano, nem se colocar como juiz, mas se deixar impressionar e às vezes sofrer pelas histórias que encontramos, a fim de poder contá-las com humildade a nossos leitores".

“A realidade é um grande antídoto para muitas ‘doenças’. A realidade, o que acontece, as vidas e os testemunhos das pessoas, são o que merece ser contado”

Neste ponto Francisco acrescentou seu agradecimento aos jornalistas que contam a verdade também “pelo que nos dizem sobre o que está errado na Igreja, por nos ajudar a não esconder debaixo do tapete e pela voz que vocês deram às vítimas de abusos”.

A Igreja não é uma empresa

Por fim o Papa disse: “Lembrem-se também que a Igreja não é uma organização política com esquerdas e direitas como nos parlamentos. Não é uma grande empresa multinacional dirigida por executivos que estudam como vender melhor o seu produto. A Igreja não se constrói com base em seu próprio projeto, não tira de si mesma a força para seguir adiante e não vive de estratégias de marketing. “A Igreja”, disse o Papa, “é formada por homens e mulheres pecadores como todos os demais, nasceu e existe para refletir a luz de um Outro, a luz de Jesus, assim como a lua faz com o sol. A Igreja existe para levar a palavra de Jesus ao mundo e tornar possível hoje um encontro com o Jesus vivo, tornando-se um veículo para seu abraço de misericórdia oferecido a todos”.

“Obrigado, queridos amigos, por este encontro. Obrigado e parabéns aos nossos dois 'decanos', que hoje se tornam 'Dama' e 'Cavaleiro' da Grã Cruz da Ordem Pia. Obrigado a todos vocês pelo trabalho que fazem. Obrigado por sua busca da verdade, porque somente a verdade nos liberta”.

 

- Papa: Ratzinger, um magistério luminoso e um amor infalível pela Verdade

Na manhã deste sábado (13/11) o Papa Francisco participu da entrega do Prêmio Ratzinger: estudiosos com suas famílias e amigos que testemunham um "vínculo duradouro" em benefício do serviço da Igreja no mundo da cultura. Francisco dirigiu seu pensamento "afetuoso, grato e admirador" ao Papa emérito

Adriana Masotti – Vatican News

Após a pausa do ano passado, devido à pandemia, retoma e encontro anual promovido pela Fundação Vaticana Joseph Ratzinger-Bento XVI, com a entrega do Prêmio Ratzinger. O Papa Francisco aproveitou a oportunidade para saudar e falar com estima e carinho de seu predecessor "um exemplo de dedicação apaixonada ao estudo e à pesquisa" que sempre uniu "sua fé e seu serviço à Igreja".

Na mente humana a "centelha" acesa por Deus

Francisco comprimentou com prazer a professora Hanna-Barbara Gerl-Falkovitz e o professor Ludger Schwienhorst-Schönberger, premiados este ano, assim como os professores Jean-Luc Marion e a professora Tracey Rowland, premiados em 2020, juntamente com outras personalidades premiadas em anos anteriores. É um "vínculo duradouro" e "uma relação fecunda" que a iniciativa estabeleceu, disse o Papa, entre a Igreja e o mundo da cultura, e observou que a comunidade de premiados cresce a cada ano em número, origem e variedade de disciplinas. Disse também que a capacidade da mente humana "é o efeito da ‘centelha’ acesa por Deus na pessoa feita à sua imagem" que a impulsiona continuamente "a expressar a vitalidade do espírito na formação e transfiguração da matéria". Mas reconhece, isto não é feito sem esforço:

"A Escritura nos fala da criação de Deus como "trabalho". Portanto, prestamos homenagem não apenas à profundidade do pensamento e dos escritos, ou à beleza das obras artísticas, mas também ao trabalho gasto generosa e apaixonadamente durante tantos anos, a fim de enriquecer a imensa herança humana e espiritual a ser compartilhada. É um serviço inestimável para a elevação do espírito e da dignidade da pessoa, para a qualidade das relações na comunidade humana e para a fecundidade da missão da Igreja".

Entre os grandes mestres o pensamento de Joseph Ratzinger

A apresentação das obras dos premiados, continuou o Papa Francisco, nos deu a oportunidade de observar as "correntes do espírito" da filosofia à religião, à fenomenologia do ser, e a evocação dos nomes de muitos "grandes mestres da filosofia e da teologia de nosso tempo", interlocutores de suas pesquisas, tais como Guardini, De Lubac, Edith Stein, Lévinas, Riceuur e Derrida, até McIntyre, "nos educam a pensar para viver nossa relação com Deus e com os outros cada vez mais profundamente, para orientar a ação humana com virtude e sobretudo com amor". E o Papa continuou:

"Entre estes mestres uno um teólogo que foi capaz de abrir e alimentar sua reflexão e seu diálogo cultural em todas estas direções juntas, porque a fé e a Igreja vivem em nosso tempo e são amigas de toda busca pela verdade. Falo de Joseph Ratzinger".

Reconhecimento e estima pelo predecessor

Esta é, portanto "a ocasião para enviar-lhe mais uma vez nosso pensamento afetuoso, grato e admirador". Francisco recorda o encontro deles por ocasião do 70º aniversário de sua ordenação sacerdotal:

"...sentimos que ele nos acompanha com a oração, mantendo seu olhar continuamente voltado para o horizonte de Deus. Basta olhar para ele para perceber isto. Hoje agradecemos-lhe em particular porque foi também um exemplo de dedicação apaixonada ao estudo, à pesquisa, à comunicação escrita e oral; e porque ele sempre uniu plena e harmoniosamente a sua pesquisa cultural com a sua fé e o seu serviço à Igreja".

O testemunho de uma busca contínua do rosto de Deus

O Papa Francisco recorda o compromisso de Ratzinger com o estudo e a escrita, que continuou durante seu pontificado para completar a trilogia sobre Jesus "e assim nos deixar um testemunho pessoal único de sua constante busca pelo rosto do Senhor". De seus escritos, observa, nos sentimos "inspirados e encorajados, e lhe asseguramos nossa recordação para o Senhor":

"Como sabemos, as palavras da Terceira Carta de João: "cooperatores veritatis" são o lema que ele escolheu quando se tornou Arcebispo de Munique. Elas expressam o fio condutor das diferentes etapas de sua vida, desde seus estudos ao seu ensino acadêmico, ao ministério episcopal, ao serviço à Doutrina da Fé - à qual foi chamado por São João Paulo II 40 anos atrás - até seu Pontificado, caracterizado por um magistério luminoso e um amor infalível pela Verdade".

O lema 'cooperatores veritatis' continua a inspirar o compromisso dos estudiosos premiados pela Fundação Ratzinger e Francisco conclui afirmando que essas palavras 'podem e devem inspirar cada um de nós em nosso trabalho e em nossas vidas'.

 

Fonte: Vatican News