Política

Erro do Congresso muda destino de R$ 25 mi em texto já aprovado





O Congresso Nacional mudou o destino de R$ 25 milhões de um projeto de leidepois de deputados e senadores já o terem aprovado. O texto destinava o valor ao Ministério do Desenvolvimento Regional, mas foi enviado para a sanção presidencial com os recursos alocados no Ministério da Saúde.

O trecho em questão foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). O Executivo, no entanto, não menciona o erro do Congresso ao justificar o veto. Nem devolve os R$ 25 milhões para o Desenvolvimento Regional. O erro exigirá a correção do texto sancionado.

O valor acrescentado para a Saúde depois da aprovação do projeto foi vetadopor Bolsonaro porque, segundo o Planalto, seria destinado a pagar emendas parlamentares, que não era o objetivo do PLN 40 (Projeto de Lei do Congresso Nacional).

No Desenvolvimento Regional, o recurso seria destinado ao apoio a projetos de desenvolvimento sustentável. O ministério, chefiado por Rogério Marinho, é um dos principais beneficiados pelas emendas parlamentares.

O erro foi posteriormente notado tanto por integrantes do governo quanto por servidores do Congresso. Todas as partes foram procuradas para explicar o caso oficialmente para a reportagem. Só o relator do texto, Roberto Rocha(PSDB-MA), e o MDR (Ministério do Desenvolvimento Regional) não se manifestaram.

O presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou que a Casa identificou o erro e determinou sua correção. A prática é permitida pelo Regimento Comum do Congresso Nacional.

A versão corrigida do projeto está sendo elaborada junto com uma nota técnica que explicará o que aconteceu. Em seguida, o presidente da República será informado para corrigir o texto já sancionado e publicado. A correção precisa ser publicada até o fim desta 6ª feira (31.dez.2021). Do contrário o governo terá que editar um novo projeto de crédito suplementar.

A Secretaria Geral da Presidência da República e a Casa Civil disseram, sem explicar a sanção do texto com R$ 25 milhões a menos para o Desenvolvimento Regional, que “o Parlamento é soberano em promover, dentro dos limites legais, emendas à peça orçamentária” (leia nota ao fim desta reportagem).

O REMANEJO DE R$ 25 MILHÕES

O projeto foi enviado pelo governo ao Congresso em 30 de novembro com o valor total de R$ 889,6 milhões em remanejamentos no Orçamento de 2021. Depois, o próprio Executivo pediu para que o montante fosse ampliado para R$ 1,2 bilhão enquanto o texto ainda tramitava na CMO (Comissão Mista de Orçamento). Eis a íntegra do pedido (6 MB).

Os congressistas do colegiado aprovaram o texto com o novo valor em 8 de dezembro. No dia seguinte, a medida foi incluída na pauta do Congresso para análise de deputados e senadores.

A votação aconteceu em 17 de dezembro e foi em globo, ou seja, o PLN 40 foi aprovado junto com outros projetos e não houve contagem de votos porque a deliberação foi simbólica.

Antes que o texto fosse aprovado, entretanto, o presidente da sessão, deputado Marcelo Ramos (sem partido-AM), anunciou haver complementos de voto para o projeto. Estes não foram lidos, mas foram considerados aprovados.

“Passa-se à apreciação dos PLNs em pauta […] o PLN 40/2021 teve parecer da CMO concluído pela aprovação do projeto na forma de substitutivo. O relator, senador Roberto Rocha, apresentou complementações de voto e adendos de plenário já disponibilizados nas páginas da matéria”, disse o deputado, segundo registrado nas notas taquigráficas do dia da sessão.

O relator do projeto, senador Roberto Rocha (PSDB-MA), fez 2 complementos ao relatório aprovado pela CMO, alterando-o.

No 1º, cancelou R$ 313 milhões em recursos para o Ministério da Economia e direcionou R$ 300 milhões para o Desenvolvimento Regional (conforme mostra o quadro abaixo).

No 2º complemento, o relator remanejou outros R$ 95 milhões da pasta de Paulo Guedes para a Agricultura (R$ 10 milhões) e novamente para o ministério de Rogério Marinho (R$ 85 milhões, destacados no quadro abaixo).

Desta forma, o texto aprovado pelo plenário do Congresso mudou o da CMO porque cancelava R$ 408 milhões da Economia e repassava parte do valor para o MDR (R$ 385 milhões) e para a Agricultura (R$ 10 milhões).

Com essa mudança, o orçamento do MDR deveria totalizar R$ 411 milhões: resultado da soma dos R$ 26 milhões que constavam no projeto original (imagem abaixo) com os R$ 385 milhões das complementações de voto do relator.

É aí que os números começam a não bater mais. O projeto que consta no sistema do Congresso Nacional como aprovado pelo plenário e que foi enviado para sanção presidencial por Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Congresso, não seguia todas as alterações aprovadas no plenário.

O texto enviado e posteriormente sancionado cancelou R$ 395 milhões da Economia –R$ 13 milhões a menos do que os R$ 408 milhões do complemento de voto. Também destinou R$ 360 milhões para o MDR, além dos R$ 10 milhões para a Agricultura. Eis as íntegras dos textos aprovado (3 MB), do enviado à sanção (13 MB) e do sancionado pelo Planalto (273 KB).

Os R$ 25 milhões aprovados para o ministério de Rogério Marinho e que não apareceram no orçamento final da pasta surgiram em outro lugar: na conta do Ministério da Saúde –pasta que não era contemplada pelos complementos. A Saúde deveria ter R$ 90 milhões, mas aparece no texto enviado Planalto com R$ 115 milhões.

O projeto que chegou para o governo sancionar tinha esse deficit em uma pasta e superavit na outra sem nenhuma explicação aparente e diferente do que foi aprovado. Ainda assim, o valor total do PLN continuou em R$ 1,2 bilhão, como pedido pelo governo federal.

Depois de enviar o projeto à sanção, Pacheco chegou a alertar o Planalto sobre um erro nas dotações do Desenvolvimento Regional. Mas a correção realizada pelo Congresso manteve o remanejamento de R$ 25 milhões para a Saúde. Procurado pelo Poder360, o Congresso não esclareceu qual erro foi corrigido.

O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS

O consultor de Orçamento Orlando Neto, do Senado Federal, explica que a possibilidade de corrigir erros como esse é definida pela resolução nº 1 de 2006 do Regimento Comum do Congresso.

“O projeto de lei aprovado e enviado em autógrafo para sanção do Presidente da República não poderá ser motivo de alteração, ressalvado o caso de correção de erro material, verificado exclusivamente no processamento das proposições apresentadas, formalmente autorizado pela CMO, por proposta de seu Presidente, justificando-se cada caso”, diz o texto.

Essas alterações podem ser feitas até 30 dias depois de a lei ter sido publicada, desde que no mesmo exercício financeiro. Ou seja, a correção precisa ser feita e publicada novamente até o fim deste 31 de dezembro.

Caso o prazo não seja cumprido, o governo terá que editar um novo projeto de crédito suplementar, mas para que essa execução seja feita em 2022. Nesse caso, o Congresso analisará o novo texto seguindo o trâmite usual, como foi com o projeto sancionado com erro.

Eduardo Ubaldo, mestre em Direito Constitucional pela UnB (Universidade de Brasília), diz que a situação é “exótica”, mas avalia que se o erro for corrigido e a lei, republicada no Diário Oficial da União, o problema estaria resolvido.

“Conseguindo eventualmente corrigir o equívoco em edição próxima do DOU, não vejo problemas. Desde que, é claro, estejamos diante de clara hipótese de erro material”, afirmou.

Ele também diz ser improvável que o caso seja judicializado pois não houve dano ao erário. Isso porque o governo vetou os recursos deslocados do MDR para a Saúde e, com a correção oficial, tudo voltaria ao normal.

OUTRO LADO

Em nota, a Secretaria Geral da Presidência da República disse que vetou os R$ 25 milhões da Saúde porque a programação não constava na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Porém, não explicou a mudança no orçamento do Desenvolvimento Regional. Disse apenas que “o Parlamento é soberano em promover, dentro dos limites legais, emendas à peça orçamentária”. 

Eis a íntegra da nota da Secretaria-Geral da Presidência da República e da Casa Civil, que responderam a mesma coisa:

As programações do ministério da Saúde relacionadas à Funasa foram vetadas por não existirem na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021. Elas se referem a um tipo de crédito que é incompatível com aquele previsto no PLN 40, que é o crédito suplementar.

O Parlamento é soberano em promover, dentro dos limites legais, emendas à peça orçamentária.”

Eis a íntegra da nota de Rodrigo Pacheco:

  • “A inconsistência nos autógrafos do PLN 40/2021 foi detectada e a correção dos anexos ao PLN devidamente providenciada;
  • A versão corrigida dos autógrafos e do parecer está sendo elaborada e será disponibilizada na página de tramitação da matéria, bem como a Nota Técnica da consultoria que esclarece os pontos que mereceram retificação;
  • A Comunicação oficial do Congresso está sendo enviada à Presidência da República.”

 

Fonte: Poder360