Política

Biden viaja à Europa para discutir guerra na Ucrânia





O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, viaja à Europa nesta 4ª feira (23.mar.2022). Na 5ª feira (24.mar), participa da cúpula da Otan (Organização do Tratado Atlântico Norte) em Bruxelas, na Bélgica. Depois se reúne com líderes do G7 e da União Europeia. Na 6ª feira (25.mar), vai à Varsóvia, na Polônia, para se encontrar com o presidente polonês, Andrzej Duda.

O presidente norte-americano desembarca na Bélgica no dia em que a invasão russa ao território ucraniano completa 1 mês. No domingo (20.mar), a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, disse que “não há planos” para Biden visitar a Ucrânia. 

Segundo declaração da Casa Branca, o objetivo das reuniões de 5ª feira é “discutir os esforços internacionais para ajudar a Ucrânia e impor custos severos e sem precedentes à Rússia por sua invasão”.

Com o presidente polonês, Biden conversa sobre como “os EUA ao lado dos seus aliados e parceiros respondem à crise humanitária e de direitos humanos criada pela guerra injustificada e sem motivo que a Rússia provocou contra a Ucrânia”

Por meio do seu perfil no Twitter, Biden reforçou a declaração da Casa Branca sobre os objetivos dos encontros. O presidente norte-americano também informou o roteiro da viagem. 

“Amanhã, viajo à Europa para me encontrar com nossos aliados e parceiros exatamente um mês depois que Putin acelerou sua guerra brutal na Ucrânia” “Minha primeira parada é na Bélgica, onde me encontrarei com nossos aliados da Otan, líderes do G7 e líderes da União Europeia para discutir nossos esforços para apoiar a Ucrânia e impor custos severos à Rússia por sua invasão” “Depois, viajarei para a Polônia para uma reunião bilateral com o presidente @AndrzejDuda. Estou ansioso para discutir nossa resposta à crise humanitária e de direitos humanos que a Rússia criou na Ucrânia” “Nesta viagem deixaremos claro que o Ocidente está unido em nossa defesa da democracia. Putin pensou que nos dividiria, mas somos mais fortes do que em qualquer outro momento da história recente. Estamos com a Ucrânia e continuaremos a garantir que Putin pague um alto preço econômico por suas ações”

 

'Militarização da Ucrânia ameaça segurança europeia e global', diz Rússia

O embaixador da Rússia nos Estados Unidos, Anatoly Antonov, criticou o pedido de envio de armas para as forças ucranianas, que são atacadas pela Rússia há um mês. "A militarização da Ucrânia representa uma ameaça direta à segurança europeia e global", disse, segundo relato divulgado pela embaixada, falando sobre o risco de armas caírem nas "mãos de terroristas". O governo ucraniano pediu aos países ocidentais que entreguem "armas ofensivas" como forma de "dissuasão" contra a Rússia.

Hoje, a guerra entra em seu 28º dia, com a Ucrânia apostando em uma "defesa circular" de Mariupol, cidade portuária considerada estratégica e que está sitiada praticamente desde o início do conflito. Segundo o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, a cidade "está em ruínas".

Sobre os diálogos por paz, Zelensky disse que as negociações com a Rússia têm sido "difíceis, às vezes escandalosas, mas avançamos passo a passo". A Rússia, por sua vez, acusa os Estados Unidos de atrapalhar as "difíceis" negociações. "O lado ucraniano muda constantemente de posição. É difícil evitar a impressão de que nossos colegas americanos estão segurando as mãos deles", disse o ministro russo das Relações Exteriores, Serguei Lavrov, em um discurso a estudantes em Moscou.

Após um toque de recolher de 35 horas, a tensão continua na capital ucraniana, Kiev, que teve mais relatos de destruição. A prefeitura informou hoje que casas e prédios ficaram em chamas após o distrito de Shevchenkivskyi ser atingido.

Nesta quarta (23), haverá ao menos nove corredores de evacuação em quatro regiões do país, segundo o governo ucraniano: nas áreas de Donetsk, Zaporizhzhia, Kiev, e Lugansk.

Armas para Ucrânia

O embaixador russo nos Estados Unidos disse que "uma parte significativa das armas" enviadas à Ucrânia pode cair "nas mãos de bandidos, nazistas, terroristas e criminosos".

"Os países ocidentais não percebem que militantes que vieram de todo o mundo para a Europa podem depois aplicar a experiência de combate adquirida na Ucrânia em qualquer lugar, inclusive em casa? Eles não compreendem os riscos da disseminação de armas de mísseis transferidas para as Forças Armadas da Ucrânia em toda a União Europeia e regiões vizinhas, bem como seu uso contra a aviação civil?", disse Antonov.

Para o embaixador, "não há garantia de que as armas não cairão nas mãos de extremistas em seu território". "Apelamos aos patrocinadores do regime de Kiev para que parem de incentivar o derramamento de sangue na Ucrânia e considerem seriamente as consequências de suas atividades."

Ontem, o porta-voz do governo russoDmitry Peskov, já havia dito que a Rússia pode usar armas nucleares em caso de "ameaça existencial". Peskov disse que a Rússia tem uma "doutrina de segurança interna" para o uso de armas nucleares. "Se for uma ameaça existencial ao nosso país, então podem ser usadas de acordo com nossa doutrina", afirmou o porta-voz do governo russo. Hoje, ele classificou como "muito imprudente e extremamente perigosa" uma proposta da Polônia de enviar forças internacionais de paz para a Ucrânia.

Andriy Yermak, chefe de gabinete do presidente ucraniano, pediu "armas ofensivas" aos países ocidentais para combater as forças russas. "Nossas Forças Armadas e cidadãos estão resistindo com uma coragem sobre-humana, mas não podemos vencer uma guerra sem armas ofensivas, sem mísseis de médio alcance que podem ser um meio de dissuasão", disse Yermak.

"Uma defesa eficaz durante muito tempo é impossível sem um sistema de defesa aérea confiável, capaz de derrubar mísseis inimigos de longo alcance", argumentou Yermak. Mas "não entregam, assim como não enviam aviões", lamentou. O pedido de aviões foi sistematicamente rejeitado até o momento pelos países ocidentais, que não desejam uma intervenção militar na Ucrânia por medo a ampliar o conflito com a Rússia.

Belarus-Ucrânia

O Ministério da Defesa da Ucrânia disse que, em Belarus, país vizinho e aliado da Rússia, "representantes das forças da oposição" interromperam parcialmente a conexão ferroviária com a Ucrânia. A informação não pôde ser confirmada de forma independente até o momento.

O ministério ucraniano também disse que equipamentos militares da Rússia e de Belarus "está sendo movimentado ativamente" ao longo do território belarusso "e acumulado ao longo da fronteira ucraniana".

Para a inteligência do Ministério da Defesa do Reino Unido, "as forças russas estão tentando cercar as ucranianas no leste do país à medida que avançam da direção de Kharkiv e Mariupol". No norte da Ucrânia, a avaliação é de que os russos permanecem parados, "provavelmente conduzindo um período de reorganização antes de retomar as operações ofensivas em larga escala", segundo comunicado desta quarta. A Alemanha também avalia que a ofensiva russa "estagnou". O próprio governo ucraniano já começa a avaliar que a "fase ativa" da invasão russa terminará até o final de abril.

"Defesa circular" em Mariupol

O Ministério da Defesa ucraniano, em um resumo das operações de hoje no conflito com a Rússia, disse que "realiza a defesa circular de Mariupol". A cidade está cercada pelos russos, que tentam tomá-la.

Para o ministério, "o inimigo está desmoralizado em algumas áreas", citando Mariupol como exemplo. Ele diz que, na cidade, "menos de 10% do pessoal" das forças russas "estão prontos para continuar a guerra". "O restante do pessoal é morto, ferido, doente ou desmoralizado".

Apesar da análise do Ministério da Defesa, o Serviço de Estado para Comunicações Especiais e Proteção da Informação da Ucrânia disseram, sobre Mariupol, que "sair da cidade por transporte pessoal é muito perigoso devido aos constantes bombardeios". Ontem, 4.367 moradores de Mariupol, incluindo 1.247 crianças, foram evacuados de Berdyansk para Zaporizhzhia, segundo as autoridades da cidade portuária.

"Hoje a cidade ainda tem quase 100.000 pessoas em condições desumana. É um cerco total. Sem alimento, água, medicamentos, sob constante bombardeio", declarou Zelensky, depois de insistir no apelo para que a Rússia permita a saída dos civis por um corredor humanitário.

O Pentágono afirmou que a Rússia agora ataca a cidade com artilharia, mísseis de longo alcance, a partir de navios posicionados no Mar de Azov. As forças ucranianas também reportaram combates intensos em terra com a infantaria russa, depois que se negaram a aceitar um ultimato de Moscou na segunda-feira para a rendição.

Kiev atacada

Ao menos quatro pessoas ficaram feridas, segundo informações iniciais da prefeitura de Kiev, após casas e prédios serem atingidos e ficarem em chamas em razão de um ataque nesta quarta. "As informações sobre as vítimas e a natureza da destruição estão sendo esclarecidas", disse a prefeitura.

Na região da capital, as Forças Armadas da Ucrânia disseram que "conseguiram melhorar suas posições em Irpin", cidade próxima a Kiev. "O inimigo cava e tenta se reagrupar." A administração regional de Kiev também aponta melhora nas defesas na cidade de Makariv. "Bairros residenciais estão sendo bombardeados. Monumentos históricos, escolas, hospitais e fábricas estão sendo destruídos", disse a administração, indicando também que os "grupos inimigos estão tentando reabastecer a composição".

Chernihiv destruída

O prefeito de Chernihiv, Vladyslav Atroshenko, disse que forças russas estão atacando intencionalmente civis e instalações de infraestrutura, segundo relato da plataforma Ukrinform.

"Os militares russos estão atacando hospitais com fogo. Um hospital também é uma instalação de infraestrutura militar? É importante entender quais métodos são usados. Sua tática é destruir intencionalmente civis e instalações de infraestrutura. Não tem nada a ver com o fogo direcionado às instalações de infraestrutura militar", disse Atroshenko.

De acordo com o prefeito, são realizados cerca de 40 funerais por dia agora na cidade. "De acordo com minhas estimativas, cerca de 50% dos moradores locais deixaram a cidade. Outros 50% estão ficando, mas, infelizmente, muitas pessoas entre os que ficam não podem cuidar de si mesmas", disse Atroshenko. A cidade está sem serviços de água, gás, aquecimento e eletricidade.

China quer Rússia no G20

A China se pronunciou hoje contra uma exclusão da Rússia da próxima reunião de cúpula do G20, uma ideia sugerida pelos Estados Unidos devido à invasão da Ucrânia. "A Rússia é um país membro importante [do G20] e nenhum membro tem o direito de expulsar outro país", afirmou à imprensa o porta-voz da diplomacia chinesa, Wang Wenbin.

Ontem, Jake Sullivan, conselheiro de Segurança do presidente americano, Joe Biden, mencionou a possibilidade de exclusão da Rússia do grupo, que tem uma reunião prevista para o fim do ano na Indonésia. O governo chinês, próximo ao russo, não condenou a invasão da Ucrânia.

Os países ocidentais preparam novas sanções contra a Rússia e se reunirão amanhã (24) em Bruxelas em três âmbitos diferentes: OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), G7 e um encontro de cúpula europeu, no dia em que a guerra completará um mês.

 

- Rússia vive diáspora silenciosa: 'Minha família sofreu lavagem cerebral'

Elena*, 29, russa que vive há alguns anos na Bélgica, acordou na manhã de 24 de fevereiro com a mensagem de uma amiga no WhatsApp.

"A guerra começou", escrevera a colega de Moscou, que estava no banco sacando todo o dinheiro que tinha. Elena passou o resto do dia chorando, incapaz de acreditar que seu país havia realmente invadido a Ucrânia.

Poucos dias depois, Elena recebeu a amiga em seu apartamento — refugiada, embora fosse russa, sem quaisquer direitos na Europa, ao contrário dos refugiados ucranianos.

Não se sabe o número exato, mas centenas, talvez milhares de russos têm deixado o país desde o início da guerra com medo de serem perseguidos ou por sentirem que não podem mais viver em seu país. Sentem-se sufocados.

"Não posso falar sobre política com minha família. Eles sofreram lavagem cerebral e acreditam na propaganda de Putin", diz Elena. Seu tio chegou a lhe enviar uma notícia de uma página de notícias falsas e bem-humoradas, acreditando que o conteúdo era real — mesmo com um alerta no topo da página sobre conteúdo falso e humorístico do site.

Elena não acredita que poderá voltar para casa até que o regime caia. Enquanto isso, ajuda a amiga e vê outros conhecidos deixando a Rússia - alguns foram para a Armênia, outros para Turquia e Geórgia. Forma-se uma diáspora de refugiados russos.

Os que decidem ficar - seja com a intenção de desafiar o regime, seja por não terem meios de deixar o país - relatam um clima de medo. Qualquer pessoa que protesta - ou que critica o governo e a guerra online - pode ser presa por 15 anos. Calcula-se que mais de 15 mil russos foram detidos por protestar, desde o começo da guerra.

Aperto econômico

Para quem fica na Rússia, a realidade é de preços cada vez mais altos.

"Comida, remédios e até produtos de limpeza subiram mais de 10 vezes", conta Katya, que vive em São Petersburgo e preferiu não dar sobrenome nem idade. Na antiga capital do Império Russo, o desânimo impera. As reações ao começo da guerra são parecidas. Tanto Elena quanto Katya choraram, em conversa com a reportagem.

"A manhã do dia 24 foi de horror, medo e lágrimas. A primeira mensagem que escrevi à família e amigos foi: 'a Rússia invadiu a Ucrânia, [começou] a guerra'. Escrevi com lágrimas nos olhos, considerando-me uma fascista, e já na noite daquele dia saí para a rua e gritei 'não à guerra', até ficar rouca," relembra Katya.

Em um piquete, pintou uma bandeira da Ucrânia no rosto e vestiu uma camisa em que se lia "Linda Rússia do futuro". Ela teve o celular arrancado das mãos e foi levada a uma delegacia, onde foi interrogada das 22h até 1 da manhã pelo chefe do serviço federal de segurança (a temida FSB) e por um oficial da área de contra-terrorismo.

"Eles me torturaram com um interrogatório brutal, tentaram acessar meu celular para descobrir de que canais [do Telegram] eu participava. Diziam que eu era uma das organizadoras do protesto, mas não organizei nada. Ameaçaram me processar por 'espalhar fake news', um crime no país, se eu abrisse minha boca para defender a Ucrânia", contou.

Pelo Telegram, Sophia*, uma operadora de câmera de Moscou, explica à reportagem que "praticamente tudo mudou" desde que a guerra começou.

"Estou incrivelmente envergonhada, porque meu país está fazendo coisas horríveis que não podem ser justificadas. É um crime terrível que não vai ser perdoado ou esquecido facilmente. É como se uma grande parte de você tivesse morrido. Você continua fazendo suas coisas em modo automático, mas não vê propósito", explica.

Sophia trabalha majoritariamente com clientes estrangeiros, por isso enfrenta problemas, já que a Rússia se encontra sob pesadas sanções econômicas. Seu banco ainda não teve o Swift bloqueado, mas o governo bloqueou todos os pagamentos em moeda estrangeira. "Se o pagamento for feito em dólares, só posso receber em rublos. O problema é que o valor do rublo caiu e ele continua caindo a cada dia."

Dezenas de marcas e empresas deixaram a Rússia sem perspectiva de retorno. Apesar de todas as privações e da expectativa de que tudo piore, Sophia se opõe à guerra e a Putin e não culpa o Ocidente pelo que acontece.

"Não há como encontrar nenhuma razão para que alguém queira a guerra. Parece uma boa ideia apenas nos sonhos loucos de Putin, que acabou de destruir dois países com um só golpe e continua destruindo a Ucrânia com bombas e destruiu a economia russa e nosso futuro."

Cada vez que o presidente russo fica mais acuado, a violência policial cresce. Sophia lembra que, há 10 anos, a polícia não era tão violenta para dispersar protestos. "Agora são puro terror."

Além disso, explica, "quando os policiais te levam para a delegacia, te humilham o máximo que podem, e há alta probabilidade de você ser espancado. Não é uma surpresa que as pessoas tenham realmente medo de protestar".

Ao longo dos dias ela mudou de opinião várias vezes sobre o futuro. Hoje pensa que o país pode ficar numa espécie de "pântano soviético reencarnado por anos", diz, com uma nota de pavor, mas ainda tentando manter a esperança de que o regime pode cair e as coisas podem melhorar.

'Nova Chechênia'

Também de Moscou, mas escondido em um lugar desconhecido, o político de oposição Aleksei Miniailo, 37, conversa apressado no telefone. Nervoso, derruba o que tinha em cima da mesa enquanto digita freneticamente no computador mensagens para amigos e outros ativistas.

Ao contrário dos demais, ele pede para que seu nome seja usado - "é uma forma de me proteger, afinal sou uma pessoa pública".
Mas é difícil saber se ele terá algum tipo de proteção caso seja pego pela polícia. Historiador formado pela Universidade Estatal de Moscou, juntou-se à greve de fome de Lyubov Sobol, advogada próxima ao líder opositor Alexey Navalny, em 2019. No mesmo ano, Miniailo foi preso por dois meses, acusado de promover protestos.

Hoje, enquanto evita ser preso novamente, participa de um grupo de acadêmicos, pesquisadores, ativistas e empresários levando adiante o projeto 'Os russos querem a guerra?', em que analisa pesquisas de opinião de forma crítica.

"Pesquisamos a opinião pública na Rússia e a explicamos. Os números brutos são enganosos, porque em autocracias e ditaduras as pesquisas não representam realmente a opinião pública. Os números têm que ser explicados e mais hipóteses precisam ser testadas para se obter algo da pesquisa", ele explica.

O dia a dia de Miniailo é o de tentar parar a guerra. De seu esconderijo ele conversa com pessoas, tenta persuadi-las a sacrificar sua segurança - como ele - para parar a guerra.

"A maioria das pessoas veem menos produtos nas lojas e supermercados, preços cada vez mais altos, medicamentos acabando nas farmácias. Coisas importadas estão sumindo das prateleiras", diz ele, lembrando que os preços subiram muito mais do que o governo divulga. "Mesmo coisas muito russas, como a batata, têm subido de preço porque as sementes vêm do exterior."

"Putin pensou que ganharia essa guerra na Ucrânia em alguns dias, mas calculou mal. O que vejo agora é mais como a guerra na Chechênia em 1994", diz o político. Em 1996, a Chechênia conseguiu efetivamente sua independência da Rússia, perdendo-a na segunda guerra contra o país, anos depois.

Para ele, o principal problema é que a Ucrânia é o país mais próximo da Rússia — 20% dos russos têm parentes na Ucrânia. "Se não conseguimos dialogar com a Ucrânia, mas preferimos lançar foguetes, como podemos encontrar terreno comum com qualquer outro país?".

Por isso ele se dedica a ir mais fundo nas pesquisas de opinião. Ele acredita que as pessoas estão apavoradas, não conseguem entender o que acontece. Não tiveram tempo para processar que um país irmão está sendo atacado, então acabam apenas repetindo a propaganda. Mesmo aqueles de seu circuito mais próximo, mais politizados, têm dificuldade em entender o que acontece. "Levará tempo para que os russos se mobilizem."

Não há justiça

Da cidade de Reutov, a alguns quilômetros de Moscou, o jornalista e ativista pelos direitos humanos Evgeny Kurakin, 45, pede para que seu nome seja publicado. "Sou perseguido por minhas atividades profissionais há 11 anos", diz, com certa indiferença, acrescentando que já foi reconhecido como prisioneiro político pela organização dos direitos humanos Memorial - organização que vem sendo perseguida pela justiça russa e, em 2021, teve seu fechamento ordenado.

Estou constantemente nas cortes e raramente vejo justiça por al", diz Kurakin. "Depois de terem sido jogados para fora do Conselho da Europa, fomos privados do direito de recorrer das decisões dos tribunais russos. As perspectivas na Rússia se tornaram completamente sombrias."

Kurakin comenta que andar pelo centro de Moscou tem sido uma experiência assustadora. Sobram espaços vazios e os preços subiram assustadoramente.

Sussurros são ouvidos por todas as partes. Mesmo que não possam levantar a voz, a sociedade discute os eventos e não se mostra satisfeita. As consequências são muito pesadas e a propaganda é tão descarada que as pessoas começam a desconfiar das autoridades.

"Falo isso baseado em minhas amizades: lhes dou informações alternativas e hoje eles já começam a questionar e fazer as perguntas certas. Nem tudo está perdido", afirma, com indisfarçável alegria.

Sobre Putin, Kurakin acredita que ele "destruiu o sistema de justiça, destruiu a instituição das eleições, destruiu a liberdade de expressão, a competição, e fez o país recuar décadas. Tudo que ele foi capaz de desenvolver com sucesso foi corrupção".

Como Sophia, ele vê a situação com algum pessimismo para o futuro imediato, mas acredita que "o regime apressou seu desaparecimento" e não se sustentará para sempre.

* Nomes trocados a pedido dos entrevistados
** Agradecimentos a Svetlana Koshkareva, cidadã russo-canadense, pelos contatos e tradução

 

Chernobyl: Ucrânia denuncia ataque russo a laboratório

A agência estatal ucraniana responsável pela zona de exclusão da Central Nuclear de Chernobyl acusou, nas últimas horas, as forças russas de terem destruído um novo laboratório no complexo dedicado à gestão de resíduos radioativos.

A ocupação russa da central nuclear, desativada após o desastre de 1986, concretizou-se logo no início da invasão da Ucrânia, no fim de fevereiro.

O laboratório abriga "amostras altamente ativas e amostras de radionuclídeos que estão agora nas mãos do inimigo", segundo a agência estatal ucraniana responsável pela zona de exclusão. As autoridades ucranianas lembram que o laboratório agora destruído foi inaugurado em 2015 e custou 6 milhões de euros, em projeto apoiado pela Comissão Europeia.

Os radionuclídeos são átomos de elementos químicos que libertam radiação.

"Esperamos que só cause dano a si mesmo e não ao mundo civilizado", diz a agência em comunicado. 

A agência nuclear da Ucrânia tinha afirmado, na segunda-feira, que os monitores de radiação em torno da Central de Chernobyl haviam deixado de funcionar. A informação gerou preocupações entre especialistas.

Rotação de turnos

Também na segunda-feira, a Agência Internacional de Energia Atómica (Aiea) adiantou que os trabalhadores ucranianos na Central de Chernobyl, que asseguravam as operações desde o início da invasão russa, em 24 de fevereiro, foram substituídos, no fim de semana, por outra equipe. Todo os profissionais são oriundos da localidade vizinha de Slavutych.

"O novo turno inclui dois supervisores, em vez de um habitual, para assegurar que há reserva disponível no local", acrescentou a Aiea.

A agência das Nações Unidas citou entendimento firmado com os russos tendo em vista a organização das rotações de turnos.

Fonte: Poder360 - UOL - Reuters - Agência Brasil