Economia

Papa: é urgente uma nova economia mundial que seja inclusiva





Inclusiva, explicou Francisco em discurso aos participantes do Congresso Internacional da Uniapac, ao dar uma vida digna aos jovens, pobres, migrantes e marginalizados com a criação de empregos. Na audiência desta sexta (21) a empresários de 40 países, também provenientes do Brasil, o Papa afirmou que qualquer nova economia para o bem comum também deve cuidar da natureza, assegurando um futuro sustentável às novas gerações.

A Sala Paulo VI, no Vaticano, recebeu nesta sexta-feira (21) mais de 800 gestores e empresários de 40 países, inclusive cerca de 20 deles do Brasil, que participam do 27° Congresso Mundial da Uniapac - a União Cristã Internacional de Executivos, uma organização ecumênica sem fins lucrativos com sede em Paris. O evento de três dias termina neste sábado (22), com o ponto alto justamente no encontro com o Papa Francisco que procurou reforçar o compromisso da nobre vocação da classe através do tema que orienta o evento, ou seja, "a coragem de mudar" o modo de viver dentro das empresas, as relações entre dirigentes e dependentes e até com o meio ambiente.

“A mudança sempre requer coragem. Mas a verdadeira coragem também exige que sejamos capazes de reconhecer a graça divina na nossa vida.”

A nova economia para o bem comum

A graça de Deus, continuou o Papa em discurso, permite guiar as relações dentro do mundo dos negócios para se criar uma nova economia para o bem comum, mesmo diante de tantos desafios para colocá-la em prática. "Não há dúvida de que nosso mundo precisa urgentemente 'de uma economia diferente, aquela que faz viver e não mata, inclui e não exclui, humaniza e não desumaniza, cuida da criação e não a destrua", disse Francisco ao citar mensagem do evento 'Economia de Francisco' (2019).

"Portanto, qualquer 'nova economia para o bem comum' deve ser inclusiva. Muitas vezes o slogan 'não deixar ninguém para trás' é proferido sem qualquer intenção de oferecer o sacrifício e o esforço para realmente transformar essas palavras em realidade. [...] No cumprimento da profissão, vocês, líderes de empresas e empresários, são chamados a agir como fermento para garantir que o desenvolvimento chegue a todas as pessoas, mas especialmente às mais marginalizadas, mais necessitadas, de modo que a economia possa sempre contribuir para o crescimento humano integral."

Francisco, assim, elencou os trabalhadores à margem do mercado de trabalho aos quais os empresários são chamados a priorizar com a criação de emprego: os pouco qualificados; diaristas; do setor informal; trabalhadores migrantes e refugiados; aqueles que "realizam o que é comumente chamado de 'trabalho de três dimensões': perigoso, sujo e degradante; pobres e marginalizados.

“Na verdade, a porta de entrada para a dignidade de um homem é o trabalho. Não basta levar o pão para casa, é necessário ganhar o pão que eu levo para casa.”

A "economia do Evangelho"

A Uniapac, que representa mais de 45 mil executivos da Europa, América Latina, América do Norte, África e Ásia, procura promover a visão dessa economia a serviço da pessoa e do bem comum. Mas o Papa vai além e pede que também seja integrada a uma "economia de cuidado", inclusive do meio ambiente, sem destruir a criação. Esse é um dos pontos principais do Pacto assinado no fim de setembro, em Assis, por mil jovens economistas e empreendedores para melhorar o sistema econômico global, que Francisco compartilhou na audiência desta sexta (21). "Para uma nova economia do bem comum", eles propuseram uma "economia do Evangelho", que, entre outras coisas, inclui:

- uma economia de paz e não de guerra;
- uma economia que cuida da criação e não a destroi;
- uma economia a serviço da pessoa, da família e da vida;
- uma economia onde o cuidado substitui o descarte e a indiferença;
- uma economia que não deixa ninguém para trás;
- uma economia que reconhece e protege o trabalho decente e seguro para todos;
- uma economia em que as finanças sejam amigas e aliadas da economia real e do trabalho, e não contra eles.

“Gostaria de encorajá-los, líderes de empresas e empresários maduros e bem-sucedidos, a considerar uma nova aliança com os jovens que criaram e se comprometeram com esse Pacto. É verdade que os jovens sempre trazem problemas, mas têm o talento de mostrar o verdadeiro caminho. Para caminhar com eles, ensiná-los e aprender com eles, ensiná-los também; e, juntos, dar forma a 'uma nova economia para o bem comum'. Obrigado pelo que fazem, obrigado por estarem aqui.”

Andressa Collet 

 

- O Papa: propor o acesso ao trabalho como objetivo prioritário para todos

Na audiência aos administradores públicos franceses, o Papa destacou a importância "do acolhimento dos desfavorecidos, sobretudo os migrantes", e pediu uma maior atenção "aos idosos nos asilos, e às pessoas no fim de suas vidas, que devem ser acompanhadas através do desenvolvimento de cuidados paliativos".

O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta sexta-feira (21/10), no Vaticano, uma delegação de administradores públicos e representantes do Estado francês, provenientes do norte da França, junto com o arcebispo de Cambrai, dom Vincent Dollmann.

Esta região da França, "outrora rica em minas de carvão, de uma forte indústria metalúrgica e renomadas fábricas têxteis, sofreu um terrível revés com o fechamento de minas e fábricas durante a revolução industrial do final do século XIX".

"Infelizmente, a crise econômica também significa empobrecimento da população dessas regiões. Eu sei que esse é o desafio que vocês enfrentam há algumas décadas. Além da preocupação prioritária com as questões sociais, sei que vocês também têm no coração a dimensão cultural da sua região, cientes de que o homem não se nutre só de pão, mas também do orgulho de suas raízes que a cultura evidencia, ajudando assim a lembrar a cada um, sua própria dignidade", disse Francisco, acrescentando:

É nessas áreas de ação social e cultural que vocês podem encontrar-se, qualquer que seja sua pertença política. Ao dar prioridade às necessidades essenciais de seus cidadãos, muitas vezes transcurados em favor de temas da moda que têm menos a ver com suas vidas diárias, vocês podem demonstrar sua vontade de estar a serviço daqueles que o elegeram e que depositaram sua confiança em vocês. O método democrático e representativo também deve permitir a vocês de levar à atenção das mais altas autoridades as aspirações e necessidades reais da população de seu território, longe de qualquer ideologia ou pressão da mídia.

A seguir, o Papa os encorajou com duas palavras ligadas aos eventos atuais: acolhimento e cuidado.

Primeiramente, o acolhimento dos desfavorecidos, sobretudo os migrantes, e vocês sabem o quão crucial é essa questão e o quanto ela está no meu coração. Mas, também penso nas pessoas com deficiência. Elas precisam de mais estruturas para facilitar suas vidas e as de seus entes queridos e, acima de tudo, para mostrar o respeito que lhes é devido. Que as medidas de inclusão possam permitir a muitos deles ter um lugar no mundo do trabalho. É necessário continuar propondo o acesso ao trabalho como objetivo prioritário para todos!

Em relação ao cuidado, o Papa pensou "em particular na atenção a ser dada aos idosos nos asilos, e às pessoas no fim de suas vidas, que devem ser acompanhadas através do desenvolvimento de cuidados paliativos". "Os agentes de saúde, por natureza, têm a vocação de prestar cuidado e alívio, nem sempre podendo curar, mas não podemos pedir aos agentes de saúde para matar seus pacientes! Se matarmos com justificativas, acabaremos matando cada vez mais. Ouso esperar que, em questões assim essenciais, o debate possa ser conduzido na verdade para acompanhar a vida ao seu fim natural", sublinhou Francisco.

Segundo o Papa, "a esfera cultural é um importante fator de unidade na medida em que se apresenta como fruto de um passado comum. A sua região foi palco de eventos que a moldaram e que cabe a vocês valorizar a fim de passar seu legado para as gerações futuras".

Francisco sublinhou que "a Igreja sempre se preocupou com o desenvolvimento integral dos abandonados da sociedade e vocês podem contar com sua ajuda". "Junto com vocês, ela procura alcançar os migrantes, os idosos e os doentes, ou seja, todos aqueles que são "deixados para trás", cuja maior pobreza é, sem dúvida, a exclusão e solidão", disse ainda o Papa, ressaltando que "em relação aos migrantes, não podemos esquecer que o migrante deve ser acolhido, acompanhado, promovido e integrado". "Não deixar o migrante sem integração, porque isso é um perigo", concluiu o Papa.

Mariangela Jaguraba - Vatican News

 

Francisco: Edith Bruck, sinais de luz na escuridão do Holocausto

Hoje será lançado o livro "Eu sou Francisco" de Edith Bruck, que nasceu de uma reflexão da escritora após a visita que ela recebeu do Papa em fevereiro de 2021. Abaixo está o prefácio do livro escrito pelo Pontífice

Quando li no jornal L'Osservatore Romano de 26 de janeiro de 2021, na véspera do Dia da Memória do Holocausto, a bela entrevista de Francesca Romana de' Angelis com Edith Bruck, fiquei impressionado com a força tranquila e luminosa desta mulher. Na sua vida ela conseguiu encontrar, e depois transmitir na sua obra literária, vários "pontos de luz" em um dos abismos mais escuros da história humana. Fechei o jornal e liguei para o editor-chefe Andrea Monda, pedindo-lhe que marcasse um encontro comigo para encontrar a Sra. Bruck.

E assim, nem mesmo um mês depois, fui visitá-la na sua casa no centro de Roma. Foi uma visita emocionante para nós dois. Uma emoção que a Sra. Bruck agora quis recontar, e eu lhe agradeço por isso, neste livro que tenta sintetizar uma experiência muito difícil de retratar e transmitir. Assim que saí do elevador, ela me cumprimentou na porta em silêncio, porque sua emoção quase a impedia de falar: entre as lágrimas que tomaram conta, ela me agradeceu pela visita e eu, por sua vez, lhe agradeci pelo testemunho que ela deu, que ela tinha dado durante todos estes anos, eu diria melhor, o testemunho do que ela foi e é. Uma memória viva, era o que eu tinha diante dos meus olhos: nesta senhora miúda e elegante de noventa anos, dotada da força que lhe permitia chorar, acolhendo e não resistindo ao dom das lágrimas, eu contemplava uma memória viva, que se fez pessoa.

Ela me recebeu na sala da sua casa junto com seus parentes mais próximos e passamos muito tempo conversando. Lembro-me que falamos sobre aqueles "pontos de luz" que ela tinha conseguido relatar em seus livros, mas também sobre outra coisa, a condição dos idosos, sua intensa experiência com seu marido Nelo Risi, que sofria de Alzheimer há muito tempo, de cinema (com seu sobrinho Marco falamos sobre o filme Il Sorpasso) como se faz em uma agradável conversa doméstica, familiar.

Depois nos falamos e nos encontramos outra vezes, em ocasiões públicas e, recentemente, novamente em particular, mas desta vez na minha casa, na Casa Santa Marta. Era novamente 27 de janeiro, Dia da Memória. Entretanto, a situação mundial tinha mudado e os ventos da guerra tinham começado a soprar novamente, mesmo na Europa. A Sra. Edith veio me visitar com sua fiel ajudante, Olga, uma ucraniana, com quem inevitavelmente conversamos sobre o que estava acontecendo na fronteira daquela terra agora martirizada.

Como é importante que a memória não se perca! Precisamos de pessoas que, mesmo que apenas por viver, mantenham viva a memória, mantenham seu fogo aceso. Edith e Olga me trouxeram um pão feito por elas, que recordava aquele "pão perdido" da sua mãe que a escritora imortalizou em um de seus livros. Talvez nenhum pão tenha se perdido definitivamente, sempre pode ser recuparado. A Esperança sempre reaparece e sempre nos surpreende. É a irmã menor que arrasta as duas maiores pela mão, Fé e Caridade, como canta Péguy. Aquele pão que não era mais perdido, tínhamos em nossas mãos. Nós o dividimos, juntos, e comemos parte dele. Um gesto simples, humano. Como uma oração. Assim, quase em silêncio, nos fizemos "companhia", comendo juntos o pão. Talvez seja assim que podemos recomeçar, recomeçar como humanidade, fazendo algo juntos, talvez a coisa mais simples, alimentando-nos.

A humanidade é algo delicado, frágil, sempre pronta a se despedaçar, a se deteriorar, a degenerar. Mas às vezes também acontece de encontrar pessoas, é o caso da Sra. Edith, que revelam recursos impensáveis, uma força que brota não se sabe bem de onde e que supera todas as adversidades e permite permanecermos humanos.

O livro que vocês têm em mãos é uma tentativa de recontar este encontro que me deu tanta força e esperança e um sentimento de gratidão, de confiança, que estou convencido que também será comunicado àqueles que optarem por lê-lo; pelo menos essa é minha esperança.

 

- Santa Sé na ONU: os Estados respeitem sempre a vida e a dignidade de cada pessoa

O nítido "não" à pena de morte, de forma alguma admissível, e a necessidade de garantir a todos os direitos humanos fundamentais, reconhecidos pela Declaração Universal, no centro dos discursos do arcebispo Caccia na 77ª Assembleia Geral. O observador permanente da Santa Sé espera uma moratória sobre a pena capital com vistas à sua eliminação, e sobre os direitos pede que se evite a "colonização ideológica"

Dois discursos no mesmo dia para reiterar os pontos de vista da Santa Sé sobre a pena de morte e a implementação de instrumentos de direitos humanos. Estes foram tratados na quarta-feira, 19 de outubro, pelo observador permanente da Santa Sé nas Nações Unidas, dom Gabriele Caccia, durante a 77ª Assembleia Geral da ONU em curso em Nova York.

Direito à vida fundamento de todos os outros direitos

"A Santa Sé é uma firme defensora da abolição da pena de morte". Esta é a declaração inicial de dom Caccia, que então explica as razões desta posição: a primeira é "a dignidade inviolável da pessoa humana" que nunca pode ser negada nem mesmo ao autor dos crimes mais hediondos; a segunda é a presença de sistemas penais e meios suficientes "para proteger a ordem pública e a segurança das pessoas" sem recorrer à pena de morte. A autoridade pode, portanto, recorrer a eles para garantir a justiça e o bem comum. Dom Caccia enfatiza que o direito à vida é uma consequência da dignidade da pessoa e o fundamento de todos os outros direitos. E isto tem consequências importantes na sociedade, "particularmente - evidencia o observador permanente -, nas áreas responsáveis pelo cuidado dos doentes, idosos e pessoas com deficiências". Sem o reconhecimento deste direito, adverte, facilmente se desliza na "lógica de uma cultura de morte" para a qual o mundo hoje tende.

Uma moratória sobre a pena capital com vistas à abolição

Uma justiça "eficiente e imparcial" que respeita as vítimas, pune e previne crimes e protege o bem comum é essencial, observa dom Caccia, e evita que ela se torne "uma questão privada motivada pela vingança". No entanto, a possibilidade de um erro judiciário está sempre presente, diz ele, e no caso da pena de morte não é reparável. Além disso, o arcebispo estigmatiza o uso da justiça por aqueles "regimes totalitários e ditatoriais, que a utilizam como meio para reprimir a dissidência política ou para perseguir minorias religiosas e culturais", considerando estes sujeitos como "delinquentes". Dom Caccia lembra algumas declarações do Papa Francisco nas quais ele argumenta que, em alguns casos, nem mesmo "o assassinato do criminoso seria suficiente" para compensar os danos cometidos e que "a vingança não resolve nada". Mas isto não significa impunidade. "Em tais circunstâncias - assinala o Papa -, a não aplicação da pena de morte significa optar por não ceder à mesma força destrutiva que tem causado tanto sofrimento". O convite aos Estados para tomarem "uma posição coerente" em relação ao primado da vida e da dignidade humana, "independentemente do crime cometido", que o observador permanente dirige à Assembleia, é claro. Dom Caccia apela para a "coragem de fazê-lo, incluindo a adoção de pelo menos uma moratória sobre o uso da pena de morte como um passo concreto para sua abolição universal".

Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade

Apesar do progresso feito na promoção e proteção dos direitos humanos, os desafios ao seu pleno reconhecimento permanecem. Esta foi a constatação de abertura do segundo discurso na quarta-feira de dom Caccia, sobre a questão da implementação dos instrumentos de direitos humanos. Para o arcebispo, "assegurar o pleno respeito aos direitos humanos requer um retorno aos princípios fundamentais", ao ponto de partida que é a Declaração Universal dos Direitos Humanos segundo a qual "todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos". Uma dignidade intrínseca à pessoa, qualquer que seja sua condição, e não "uma concessão do Estado ou de qualquer outro ator". O que garante nossa humanidade e dignidade comuns, diz dom Caccia, é a solidariedade, um aspecto da natureza humana que é a fonte dos deveres que cada um de nós compartilha para com os outros".

Não politizar os direitos

Liberdade e solidariedade são, portanto, "necessárias para o bem-estar" da pessoa e da humanidade, e não são valores concorrentes, sob pena de enfraquecer ambos. Os direitos humanos são considerados "indivisíveis e interligados", lembra o prelado, e depois faz uma importante recomendação: "tentativas de promover conceitos novos e controversos como os direitos humanos que não gozam de consenso e que, como o Papa Francisco observou, incluem ‘questões que por sua natureza divisória não pertencem estritamente aos propósitos da organização’, devem ser evitadas". É essa tentativa frequentemente descrita pelo Papa Francisco como "colonização ideológica". A exortação de dom Caccia é, portanto, a de se "evitar priorizar ou politizar direitos ou afirmar como direitos ideias que não têm base em tratados ou costumes", ao contrário, é necessário trabalhar, conclui ele, para que todos "possam desfrutar de direitos humanos e liberdades fundamentais claramente estabelecidos".

Adriana Masotti

Fonte: Vatican News