O dólar subiu quase 1% e passou de R$ 5,76 nesta terça-feira (29), o maior valor em três anos, com mercados analisando novos números do mercado de trabalho nos Estados Unidos, além de manter no radar expectativas com os próximos passos dos juros pelo Federal Reserve (Fed) e a disputa pela Casa Branca.
Na cena local, o foco esteve na política fiscal após nova declaração do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que um conjunto de medidas para contenção de gastos ainda não tem prazo para ser anunciado.
A divisa norte-americana encerrou a sessão com alta de 0,95%, negociada a R$ 5,762. Este é o maior valor desde 30 de março de 2021, quando encerrou na faixa de R$ 5,774.
O Ibovespa tomou direção oposta e encerrou a sessão em baixa, com perda de 0,37%, aos 130.729 pontos.
Nos próximos quatro dias, uma enxurrada de dados será divulgada, alimentando expectativas nos EUA antes de uma eleição crucial e de uma reunião do Federal Reserve.
Uma atenção especial estará no relatório de emprego de outubro nos EUA, a ser divulgado na sexta-feira (1º), em que investidores buscarão avaliar o estado do mercado de trabalho e consolidar suas apostas sobre os próximos movimentos do Fed.
Dados publicados mais cedo mostraram que a abertura de vagas de trabalho caiu para 7,4 milhões nos EUA, queda em relação à contagem revisada de agosto de 7,86 milhões de vagas , de acordo com novos dados divulgados na terça-feira pelo Bureau of Labor Statistics.
Economistas esperavam que o número de vagas de emprego chegasse a cerca de 7,9 milhões, abaixo da estimativa inicial do mês anterior de 8,04 milhões, de acordo com estimativas da FactSet.
O declínio nas vagas de emprego reflete um mercado de trabalho que desacelerou para o ritmo pré-pandemia após anos de crescimento acelerado.
O mercado precifica os próximos movimentos do banco central dos EUA, que deve realizar cortes graduais na taxa de juros em suas próximas reuniões, e as apostas na vitória do ex-presidente Donald Trump na disputa pela Casa Branca em 5 de novembro.
Dados fortes da economia norte-americana têm apaziguado temores de enfraquecimento do mercado de trabalho, o que havia motivado o início do ciclo de afrouxamento monetário pelo Fed, com um corte de 50 pontos-base na taxa. Números de inflação também têm mostrado que a alta dos preços está na direção da meta de 2%.
Operadores veem 97% de chance de o Fed reduzir os juros em 25 pontos-base ao fim de sua reunião em 7 de novembro. A perspectiva de juros mais altos do que o projetado anteriormente tem elevado os rendimentos dos Treasuries, o que favorece a divisa norte-americana.
Estará no radar ainda o PIB dos EUA para o terceiro trimestre, na quarta-feira, e o índice PCE — indicador de inflação preferido do Fed —, na quinta-feira.
“Mercado já está precificando uma vitória de Trump. Se dados vierem fortes e Trump vencer a eleição de fato, vamos ter uma nova repreficicação dos ativos, porque seria um cenário perfeito para uma política monetária mais dura nos EUA”, disse Victor Furtado, head de alocação da WI Capital.
No cenário doméstico, o mercado segue na espera de prometidas medidas de contenção de gastos pelo governo. Mais cedo, Haddad afirmou que o envio depende da definição do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Questionado sobre o andamento das tratativas, Haddad disse que o mandatário vem pedindo informações para a equipe econômica, e que esta fornece os dados necessários para sua avaliação.
“Está avançando a conversa, estamos conversando com o [Ministério do] Planejamento [e Orçamento]. Estamos fazendo as contas para a gente fazer algo ajustadinho”, disse o ministro na portaria da Fazenda.
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- Estudo do Ipea aponta injustiça tributária no Brasil
Diagnóstico publicado nesta terça-feira (29) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revela distorções do sistema tributário brasileiro que permitem que os contribuintes mais ricos paguem proporcionalmente menos impostos do que pessoas com rendimentos menores, como os trabalhadores assalariados.
De acordo com estudo assinado pelo economista Sérgio Wulff Gobetti, pesquisador de carreira do Ipea, “os rendimentos do capital são, em geral, menos tributados que os do trabalho", e "os mais ricos têm uma maior proporção de suas rendas relacionadas à remuneração do capital, disto resulta uma incidência do imposto de renda pouco progressiva ou até regressiva no topo da pirâmide.”
A análise considera o Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (IRPF), o Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social do Lucro Líquido (CSLL). Os dados são da Receita Federal do Brasil.
Aproximadamente 800 mil contribuintes com renda média de R$ 449 mil por ano pagam no máximo 14,2% de alíquota, o mesmo percentual usado para calcular o Imposto de Renda devido por uma pessoa assalariada que receba R$ 6 mil de vencimentos.
A alíquota de 14,2% é o ponto máximo de tributação entre os contribuintes mais ricos. A partir daí, cessa a progressividade da cobrança de impostos e contribuições, e as alíquotas diminuem paulatinamente à medida que os rendimentos dos declarantes aumentam.
Quando a renda média anual é de R$ 1,053 milhão, valor obtido por 1% dos contribuintes mais ricos (1,536 milhão de pessoas), a alíquota cai para 13,6%. Se a renda média anual sobe para R$ 5,295 milhões (obtida por 153 mil pessoas, 0,1% dos declarantes), a proporção de Imposto de Renda a pagar desce para 13,2%. Se a renda média anual alcança R$ 26,036 milhões (obtida pouco mais de 15 mil pessoas, 0,01% dos declarantes) a alíquota chega a 12,9%.
Na parcela de 0,01% dos declarantes mais ricos, 81% da renda procedem de ganhos de capital, lucro e juros ou de atividade rural. Entre os declarantes que foram o estrato de 0,1% mais rico, 77% da renda advêm dessas fontes. Entre os 1% mais ricos, 66% da renda são obtidos por esses meios.
“A renda acumulada pelo 1% mais rico também é um bom indicador de concentração e, no caso brasileiro, atingiu aproximadamente 23,6% da renda disponível bruta das famílias em 2022”, assinala o estudo.
A regressividade na proporção de imposto a ser recolhido pelos estratos mais ricos da sociedade brasileira “é reflexo de inúmeras distorções e privilégios perpetuados no sistema tributário brasileiro”, descreve Gobetti nas conclusões de sua análise.
Para o economista, entre as disfunções do sistema tributário nacional “destacam-se não só a isenção sobre lucros e dividendos distribuídos a pessoas físicas (caso raro no mundo atual) como também os benefícios inerentes aos regimes especiais de tributação e as brechas existentes no regime de lucro real, que tornam a tributação do lucro das empresas brasileiras tão díspar entre diferentes corporações e setores econômicos.”
Sérgio Gobetti avalia que o país tem um sistema tributário “que premia os empresários que adotem mais estratagemas de planejamento tributário ou simplesmente restrinjam a escala de seus negócios aos limites dos regimes especiais, como no caso brasileiro, [o que] gera vantagens comparativas que nada têm a ver com a atividade econômica em si.”
Os benefícios concedidos às empresas têm efeitos fiscais e oneram as contas públicas. A estimativa do Ipea é que cerca de R$ 180 bilhões deixaram de ser recolhidos entre 2015 e 2019 pelas empresas que optaram pelos regimes de tributação Simples e de Lucro Presumido.
Considerada a inflação, o valor atualizado seria de R$ 300 bilhões. As empresas que pagam imposto por aqueles regimes especiais arrecadaram apenas 25% do que pagariam caso fossem recolher tributos conforme o lucro real.
O estudo Progressividade Tributária: Diagnóstico para uma Proposta de Reforma foi publicado como nota técnica da Carta de Conjuntura disponível nosite do Ipea.
Para o autor, “é fundamental”, no debate público, “mostrar que a falta de equidade com que a renda em geral (e o lucro das empresas, em particular) é tributada tem consequências negativas não só sobre a justiça fiscal, mas também sobre a eficiência econômica.”
A regulamentação da reforma tributária em discussão no Congresso Nacional poderá reverter a regressividade de impostos e contribuições. Na semana passada, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ) aprovou um plano de trabalho para avaliar o projeto de lei que regulamenta a reforma tributária, conforme noticiou a Agência Brasil.
- Conversa com Lula sobre corte de gastos está avançando, diz Haddad
As conversas entre a equipe econômica e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em torno do corte de gastos obrigatórios estão avançando, disse nesta terça-feira (29) o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ele, no entanto, afirmou que não há números nem previsão de data para o anúncio das medidas.
“Estamos fazendo as contas para ele [o presidente Lula] para fazer uma coisa ajustadinha”, revelou o ministro ao sair para reunião com o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin.
Haddad disse que voltará a se reunir com Lula mais vezes nesta semana. Nesta segunda-feira (28), o ministro conversou por cerca de 2 horas com Lula sobre as medidas de revisão e de corte de gastos.
Segundo Haddad, a reunião foi “realmente boa”, e o presidente não vetou nenhuma medida até agora. Apenas pediu esclarecimentos, cujas respostas os ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento estão preparando.
O ministro informou desconhecer uma estimativa publicada pelo jornal O Globona semana passada, segundo a qual as medidas de corte de gastos resultariam em uma economia de R$ 30 bilhões a R$ 50 bilhões. “Não sei de onde saiu esse número. Nunca divulguei um número para vocês. Não divulgo número por que número você só divulga depois da decisão tomada”, ressaltou Haddad.
Embora tenha dito que a reunião com Lula ocorreria nesta quarta (30), o encontro foi antecipado para o início da noite de hoje no Palácio da Alvorada. O ministro está acompanhado do futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo; do secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan; e do secretário de Política Econômica da pasta, Guilherme Mello. O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio Mercadante, também chegou ao Palácio.
Fonte: Agência Brasil - CNN