Política

VTCLog teve dispensa de licitação em contratos que totalizam R$ 335 milhões





A  CPI da Covid  ouve nesta terça-feira (5) o sócio-administrador da VTCLog, Raimundo Nonato Brasil. Contratos da empresa de logística com o Ministério da Saúde estão sob suspeita de irregularidades e são investigados pela comissão. Esta é a última semana de depoimentos antes da entrega de seu relatório final, prevista para o dia 19 de outubro.

Aditivos

Visto pelos senadores como uma estratégia para lucro indevido, os aditivos nos contratos da VTCLog foram questionados pelo relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL). Nonato confirmou que houve um aditivo de R$ 80 milhões. Ele disse, porém, que isso ocorreu a pedido do Ministério da Saúde por conta de um aumento de demanda em decorrência da pandemia.

O aditivo aconteceu sem licitação, mas foi suspenso por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU).

Contratos sem licitação

Ainda durante sua intervenção, Calheiros apontou ao menos oito contratos sem licitação firmados entre a VTCLog e o Ministério da Saúde. Esse conjunto de contratos totalizou, nas contas do senador, mais de R$ 335 milhões.

Tanto o valor, quanto a falta de licitação para os contratos chamou atenção dos integrantes da CPI, pois ocorreram fora do período de pandemia. Eles foram firmados entre os anos de 2016 e 2018, quando o país não registrava nenhum caso de calamidade pública relacionado à saúde.

Na época, a pasta era comandada pelo atual líder do governo, Ricardo Barros(PP-PR).

Barros entrou no radar da CPI após o depoimento do deputado Luis Miranda(DEM-DF) que contou que, ao ser informado sobre possíveis irregularidades na compra de vacinas contra a covid, o presidente Jair Bolsonaro atribuiu ao deputado a responsabilidade sobre as negociatas.

Barros também é apontado como fiador do ex-diretor de logística da pasta, Roberto Ferreira Dias, suspeito de ter recebido valores indevidos pela VTCLog para favorecimentos nos contratos. Conforme revelado pela comissão, o ex-diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde teve boletos pagos com recursos da empresa de logística.

Em sua resposta, Nonato afirmou que, na ocasião, o Ministério da Saúde fez uma consultoria e estudos junto à empresa antes de firmar o contrato. O presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM) deve pedir ao Tribunal de Contas da União (TCU) o histórico da justificativa dada por Barros para a dispensa de licitação.

Saques em dinheiro

Os senadores também questionam o empresário sobre saques de mais de R$ 4 milhões por um motoboy da empresa. Em depoimento à CPI, o motoboy Ivanildo Gonçalves da Silva, funcionário da empresa de logística VTCLog, confirmou ter sacado mais de R$ 400 mil na “boca do caixa”. Os saques eram feitos com frequência quase que diária e os senadores apuram para quem o dinheiro era repassado.

Raimundo Nonato negou os saques de milhões pelo motoboy. Ele também rebateu a acusação de que a empresa teria pago contas de Dias em troca de benefícios no Ministério da Saúde.

“Nossa empresa é uma empresa familiar. A gente faz um cheque, vai para o aeroporto, no banco, para pagar despesa da empresa, despesa dos sócios, despesa do nosso agronegócio. O cheque não é para ser sacado e levado para a empresa", disse Nonato.

Faturamento

O faturamento dos contratos da VTCLog, desde a assinatura com o Ministério da Saúde em dezembro de 2018, foi superior a R$ 400 milhões até o momento.

Questionado sobre os critérios de contratação e pagamento, o depoente disse que isso ocorre de acordo com as demandas de logística feitas pela pasta à empresa.

Em um dos momentos da reunião os senadores detalharam o faturamento da empresa, considerado suspeito. Em 2019, esse faturamento atingiu os R$ 96 milhões e em 2020 superou os R$ 400 milhões. Eduardo Braga questionou qual o motivo do alto valor em 2019, ano em que a pandemia ainda não tinha chegado no Brasil. Raimundo Nonato respondeu que isso seria consequência competência do operacional da empresa e não tinha condições de prestar maiores esclarecimentos.

A VTClog

A VTCLog é uma empresa contratada pelo Ministério da Saúde para cuidar do armazenamento e distribuição de insumos de saúde, incluindo as vacinas contra a covid-19. A CPI apura se na relação da empresa com o ministério houve algum benefício ilícito concedido ao ex-diretor de Logística Roberto Ferreira Dias, que foi exonerado em julho suspeito de receber propina na negociação de compra de imunizantes.

Raimundo Nonato compareceu à CPI munido de habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que garante o direito de permanecer em silêncio em questionamentos que possam o incriminar.

Deferida pelo ministro Dias Toffoli, a ação também impede que o empresário seja submetido a medidas privativas de liberdade no decorrer de seu depoimento à comissão. Segundo Toffoli, o pedido se justifica pela quebra de sigilos telefônico, bancário e fiscal, que colocam o sócio do VTCLog na qualidade de investigado.

De acordo com as investigações, a VTCLog obteve um aditivo em seu contrato, autorizado por Roberto Ferreira Dias, num valor 1.800% maior que o recomendado pela área técnica. De acordo com o parecer técnico, o contrato deveria ser de R$ 1 milhão enquanto a empresa defendia R$ 57 milhões. O impasse foi resolvido diretamente por Ferreira Dias, que concordou em assinar uma contraproposta da VTCLog no valor de R$ 18 milhões, bem menor que o pedido inicial, mas ainda assim 18 vezes maior do que defendia o parecer técnico.

- Sócio da VTCLog nega saques, pagamento a Dias e ligação com Ricardo Barros

Sócio minoritário da empresa de logística VTCLog, Raimundo Nonato Brasil, negou hoje, em depoimento à CPI da Covid, relações com o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e disse que a prestadora de serviço não quitou boletos em favor do ex-servidor Roberto Ferreira Dias —demitido da diretoria de logística do Ministério da Saúde em junho deste ano.

De acordo com o depoente, não houve qualquer tipo de favorecimento à VTCLog nos negócios junto ao governo federal, o que inclui oito contratos com dispensa de licitação firmados entre 2016 e 2018, totalizando R$ 335 milhões.

Segundo Raimundo Nonato, a VTCLog seria uma empresa "familiar", com uma estrutura contábil desproporcional à realidade de outros grandes fornecedores na gestão pública. Por esse motivo, faria uso de procedimentos como pagamentos de boletos na boca do caixa e outros que levantaram suspeitas durante a apuração da CPI.

A VTCLog presta serviços para o Ministério da Saúde na área de logística, incluindo a distribuição em território nacional de insumos e vacinas contra a covid-19. Relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) enviado à Comissão Parlamentar de Inquérito aponta que a empresa da qual o depoente de hoje é sócio fez movimentações atípicas de R$ 117 milhões desde 2019.

CPI apura a existência de suposto esquema de propina da VTCLog a políticos, que teria começado em 2018, durante a gestão de Ricardo Barros à frente do Ministério da Saúde, no governo do ex-presidente Michel Temer (MDB). Barros nega as acusações.

Indagado pelo relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL), Raimundo Nonato afirmou que a VTCLog não tem qualquer tipo de vínculo com o atual líder do governo na Câmara.

Já em relação a Roberto Ferreira Dias, o empresário declarou que não houve destinação de recursos financeiros em favor do ex-servidor por meio de pagamentos de despesas pessoais. Na versão do depoente, o ex-diretor de logística do Ministério da Saúde era cliente de uma outra firma do mesmo grupo da VTCLog, a VoeTur.

"A VTCLog não pagou boleto do senhor Dias. O senhor Roberto é cliente, como qualquer outro, da empresa de turismo do grupo", disse ele. O que ocorreu, segundo relato de Raimundo Nonato Brasil, foi uma compensação de passagens aéreas que já tinham sido supostamente pagas pelo ex-servidor por meio de depósito bancário.

A versão de Raimundo Nonato, de que a transação realizada na boca do caixa não passou de uma "liquidação de boletos", não convenceu o relator, Renan Calheiros, e outros senadores da comissão. Pressionado a prestar esclarecimento mais preciso, o depoente mostrou-se confuso e afirmou que os detalhes seriam de responsabilidade do departamento financeiro da VTCLog.

Raimundo Nonato disse ainda que a empresa protestou contra Dias por dívidas que ele teria com a VoeTur.

Governo 'não pagou 1 centavo' por distribuição da Pfizer

Da mesma forma, o empresário da VTCLog disse que o governo federal tem débitos com a empresa pelo trabalho de distribuição das vacinas da Pfizer durante o enfrentamento à pandemia, em 2021.

"Olha, só pra atender a demanda da Pfizer, que o ministério não me pagou um centavo até hoje, nós tivemos que investir mais de R$ 30 milhões; nós tivemos que comprar ultrafreezers pra armazenar as vacinas da covid, -70ºC, -90ºC; nós tivemos que preparar a embalagem, porque, no mundo inteiro, não tinha essa embalagem; nós tivemos que nos preparar em três, quatro meses pra receber a vacina da Pfizer; nós tivemos que nos reinventar", argumentou.

"Não judicializamos até agora, mas nós vamos judicializar. É um direito nosso líquido e certo, vamos procurar nossos direitos", acrescentou, logo depois. 

Sócio da VTCLog nega saques de motoboy

Raimundo Nonato Brasil também negou a versão relatada pelo motoboy da VTCLog, Ivanildo Gonçalves, de que ele realizava saques em espécie para a empresa a fim de pagar contas e entregava recursos excedentes para a chefia do departamento financeiro.

Em uma explicação que não convenceu os senadores, o depoente declarou que cabia ao motoboy a função de quitar despesas da VTCLog e de seus sócios. Ele negou que, desses pagamentos, sobrava algum dinheiro em espécie.

A versão de Raimundo Nonato vai na contramão de evidências coletadas pela CPI, que mostram que Gonçalves realizou saques individuais de até R$ 400 mil em contas da prestadora de serviços contratada pelo Ministério da Saúde. A informação foi obtida durante o depoimento do motoboy ao colegiado.

Dados enviados pelo Coaf à comissão mostram que Gonçalves efetuou saques que somaram mais de R$ 3 milhões na mesma agência bancária —da Caixa Econômica Federal, localizada no aeroporto de Brasília—, somente no período entre janeiro e julho de 2021.

Pressionado pelos parlamentares, Raimundo Nonato Brasil negou por diversas vezes a realização de saques em espécie por parte do motoboy. Mas, durante o relato, disse que recursos que eventualmente possam ter retornado em espécie ao departamento financeiro da empresa eram "fundo de caixa". 

VTCLog assumiu logística na gestão Barros

Até 2018, a distribuição de vacinas e de outros insumos pelo governo federal era feita pelo próprio Ministério da Saúde por meio da Cenadi (Central Nacional de Armazenamento e Distribuição de Imunobiológicos), órgão que existiu por cerca de 20 anos.

Sob a justificativa de redução de gastos, Ricardo Barros decidiu desmobilizar a Cenadi e promover uma licitação para concentrar em uma única empresa a logística do Ministério da Saúde. A primeira colocada acabou inabilitada, e a VTCLog assumiu o contrato com o Ministério da Saúde em março de 2018, no valor de R$ 97 milhões. O contrato é válido até 2023.

A VTCLog passou a assumir a responsabilidade pelo armazenamento, controle e distribuição de todas as vacinas, medicamentos, soros e demais insumos entregues pela União a estados e municípios do país.

Segundo um parlamentar que integra a CPI, testemunhas relataram a senadores que a operadora logística contratada durante a gestão Barros seria um meio para desviar recursos do Ministério da Saúde, inclusive durante a pandemia do novo coronavírus.

Há suspeita de que um dos que receberiam a suposta propina seja o ex-diretor de logística do ministério Roberto Ferreira Dias.

Seu nome foi citado ainda pelo policial militar e lobista da Davati Medical Supply, Luiz Paulo Dominghetti, como autor de pedido de propina de US$ 1 por dose de lote de vacina contra a covid-19 Oxford/AstraZeneca ofertada ao governo federal. Dias nega quaisquer irregularidades ou solicitação indevida.

Aditivo sob suspeita

Outro ponto sob investigação da CPI é um termo aditivo firmado pela VTCLog, de cerca de R$ 18,9 milhões, com o Ministério da Saúde. Isso porque houve divergências internas na forma de se calcular o preço das cargas enviadas pela pasta aos municípios para a elaboração do documento.

Técnicos do ministério haviam estipulado inicialmente um valor de R$ 1 milhão para os serviços prestados, quase 19 vezes abaixo do que acabou sendo aceito pelo Departamento de Logística, que tinha Roberto Ferreira Dias como diretor, após revisões na metodologia de cálculos.

Dias teria, inclusive, ignorado parecer da consultoria jurídica do Ministério da Saúde contra aspectos do termo aditivo, segundo senadores.

No início de setembro, o ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) Benjamin Zymler determinou a suspensão do termo aditivo por possível "fuga ao regular procedimento licitatório" e possível "prática de ato antieconômico para a administração pública". Zymler também cobrou explicações ao ministério e à empresa.

VTCLog: Saúde não pagou 1 centavo por distribuição da Pfizer

05.out.21 - CPI da Covid ouve hoje sócio de empresa de logística VTCLog, Raimundo Nonato - Pedro França/Agência Senado

05.out.21 - CPI da Covid ouve hoje sócio de empresa de logística VTCLog, Raimundo Nonato Imagem: Pedro França/Agência Senado

O sócio da empresa de logística VTCLog, Raimundo Nonato, disse hoje na CPI da Covid que a empresa ainda não recebeu pelo serviço de distribuição da vacina Pfizer. A empresa atende ao Ministério da Saúde.

Com a vacina da Pfizer, já distribuímos 100 milhões da vacina da Pfizer, até agora, e digo pros senhores: tivemos que investir mais de 30 milhões, e, até agora, não recebemos por esse serviço prestado.Raimundo Nonato na CPI da Covid

Ele ressaltou que a VTCLog precisou investir mais de R$ 30 milhões para conseguir armazenar a vacina da Pfizer, que, segundo a orientação original da fabricante, precisa ser refrigerada a -70ºC.

"O Ministério não me pagou 1 centavo até hoje. Só para atender a demanda da Pfizer, tivemos que investir mais de R$ 30 milhões, comprar ultrafreezer para armazenar a vacina da covid, preparar embalagem, que não tinha no mundo inteiro. Tivemos que nos reinventar."

O sócio da VTCLog também comentou sobre o aditivo no contrato com o Ministério da Saúde, que é uma das linhas de investigação da CPI. Segundo Raimundo Nonato, o reajuste aconteceu pela alta demanda causada pela pandemia.

Fonte: UOL - Congresso em Foco