Polícia

Caso Emily: após quase 5 anos, ex-PM Kássio de Mangas é condenado por feminicídio com pena de 24 anos e 9 meses no regime fechado





Emily Karine de Miranda Monteiro, de 29 anos, foi morta no dia 12 de agosto de 2018. Ex-PM deverá cumprir ainda 11 meses e 21 dias de detenção por fraude processual e pagar multa de 13,5 mil aos pais da vítima em partes iguais.

O ex-Policial Militar Kássio de Mangas dos Santos, de 34 anos, réu confesso pela morte da ex-companheira, a cabo da PM Emily Karine de Miranda Monteiro, foi condenado pelo crime de feminicídio com pena de 24 anos e 9 meses de prisão no regime fechado. A decisão foi lida pela juíza Lívia Freitas, nesta segunda-feira (22), no fórum de Macapá. 

O assassino deverá cumprir ainda 11 meses e 21 dias de detenção por fraude processual, e pagar multa de 13,5 mil aos pais da vítima em partes iguais. O ex-PM não poderá recorrer em liberdade. 

Cabo Emily foi morta no dia 12 de agosto de 2018. O Ex-namorado kassio de Mangas confessou a autoria do assassinato. 

O julgamento aguardado há quase 5 anos pela família e que marcou a história da luta contra o feminicídio no Amapá começou por volta das 8h desta segunda-feira e durou quase 14h. 

O Conselho de Jurados for formado por 7 homens após a defesa de Kássio dispensar as 3 mulheres sorteadas. 

Ao todo foram ouvidas 6 testemunhas, sendo 5 de acusação e 1 de defesa, e o réu. 

A segunda testemunha interrogada detalhou que encontrou a vítima momentos após ela ser baleada. Ela afirmou que viu Emily na cama coberta com uma manta da cintura para baixo, baleada na perna e no peito e que aouviu gritar que não queria morrer. 

O réu começou a ser interrogado por volta das 15h e o interrogatório durou cerca de 2h. Ele novamente confessou o crime. 

"Em relação ao fato que ocorreu e vitimou a Emily fui eu que efetuei os disparos sim", confessou.

Kassio disse ainda que após términos, eles teriam reatado o relacionamento e que desconfiava de traições. No final do depoimento ele chorou, pediu desculpas a família da vítima e disse estar arrependido. 

"Eu queria pedir perdão para a família dela, principalmente para os pais dela. Eu tenho ciência da burrada que eu fiz dessa atitude impensada minha, mas em nenhum momento eu planejei. Naquele momento eu me descontrolei mesmo. Até hoje não consigo acreditar que eu tirei a vida de uma pessoa que era importante pra mim", falou. 

Após o término do interrogatório do réu, o Ministério Público do Amapá apresentou a tese de acusação e fez uma demonstração para explicar como os disparos atingiram o corpo da vítima. 

Também foram exibidos vídeos institucionais de combate ao feminicídio e um vídeo com fotos pessoais de Emily que causaram comoção nos familiares presentes no tribunal. 

Em seguida foi a vez dos advogados de Kássio apresentarem a tese de defesa onde foi alegado que o réu teria agido sob fortes emoções e que desconfiava que estaria sendo traído pela vítima. As partes abriram mão da réplica e da tréplica. 

Júri formado por 7 homens 

O julgamento do ex-PM kássio de Mangas dos Santos teve um conselho de sentença formado totalmente por jurados homens. 

Na Justiça brasileira, as pessoas acusadas de crimes dolosos contra a vida, naqueles casos onde houve a intenção de matar a vítima, são julgadas por 7 jurados da sociedade civil e não por um juiz. 

Em Macapá, mensalmente são escolhidos 25 jurados para servirem no Conselho de Sentença, como é chamado o grupo de jurados. Elas são convocadas sempre que há um júri e, no início do julgamento, há um sorteio para definir os 7 que vão julgar o caso. 

O Tribunal de Justiça do Amapá (Tjap) informou que cada parte (defesa do réu e acusação) tem o direito de dispensar até 3 jurados sorteados sem necessidade de justificativas. No caso do julgamento do ex-PM, dos 7 jurados sorteados, 3 eram mulheres e toda elas foram dispensadas pela defesa do réu. 

"A banca de defesa dispensou todas as mulheres (três das sete) sorteadas para compor o Conselho de Sentença, enquanto que a acusação também fez uso de tal direito. Logo no início da audiência, foram sorteados os sete jurados do caso entre as 25 pessoas selecionadas pela Justiça Estadual", informou o Tjap. 

Relembre o caso e o andamento das investigações  

De acordo com a apuração da Polícia Civil, a cabo da PM foi morta por volta das 17h do dia 12 de agosto de 2018, no quarto da casa localizada no bairro Pacoval, na Zona Norte de Macapá. 

A investigação entendeu que o crime contra Emily foi motivado pelo fato de o soldado não aceitar o término do relacionamento que tinham há quase 2 anos. 

O casal teria tido uma briga antes, o soldado retornou à casa e, então, disparou quatro vezes na ex-namorada, na cabeça, no peito, no abdome e na coxa dela. Ela estava deitada na cama, quando foi ferida pelos tiros da arma usada no crime, uma pistola .40. Câmeras de segurança mostram ele com uma arma na casa. 

Emily chegou a ser socorrida e levada para o Hospital de Emergência (HE) da capital, mas não resistiu. A polícia apurou que, depois de atirar nela, o soldado saiu calmamente do local do crime. 

Mangas teria fugido no carro de Emily e deixou o veículo no dia seguinte no terminal rodoviário de Macapá, onde recebeu carona do irmão, que disse não saber do crime. No dia 14 de agosto de 2018, dois dias após o assassinato, ele se entregou na Delegacia de Crimes Contra a Mulher (DCCM), onde prestou depoimento acompanhado de um advogado. 

Como a Justiça já havia expedido mandado de prisão preventiva contra ele, Mangas foi encaminhado ao Centro de Custódia do Zerão, na Zona Sul, onde segue preso. 

A investigação detalhou que “os quatro disparos foram efetuados lentamente, quase que como forma de tortura”, impossibilitando qualquer defesa de Emily; e que Mangas se aproveitou da relação afetiva que tinha com a vítima para cometer o crime. 

O PM foi pronunciado pela Justiça em 2019, determinando que Mangas seja submetido a júri popular pelo crime. 

Ao ser pronunciado, Mangas teve a prisão preventiva mantida pelo juiz Luiz Nazareno Hausseler, justificando que ele é uma “pessoa violenta, capaz de praticar fatos semelhantes”, além de “atemorizar as testemunhas”.

O inquérito foi concluído e o réu foi denunciado em menos de um mês após o crime. O documento acusatório foi assinado pelos promotores de Justiça Iaci Pelaes dos Reis e Eli Pinheiro de Oliveira. A audiência de instrução foi realizada em outubro de 2018, quando testemunhas e Mangas foram ouvidos pelo judiciário pela primeira vez. 

Ao denunciar o PM, o Ministério Público (MP) do Amapá elencou 10 testemunhas de acusação. Para o órgão ministerial Emily foi morta “por ser mulher, que, segundo a mentalidade machista dele, não poderia exercer sua liberdade e fazer escolhas, inclusive, a de romper o relacionamento”. 

Ainda segundo o MP, ao depôr à polícia, Mangas declarou que “estava fora de si e atordoado” no momento em que matou Emily, mas que “as provas coligidas pelas Delegadas de Polícia contradizem essa versão, evidenciando que ele praticou o assassinato de forma consciente, em atitude covarde, fria e sem demonstrar qualquer gesto de arrependimento”. 

Mangas foi denunciado por homicídio quadruplamente qualificado: 

  1. motivo torpe;
  2. uso de meio cruel;
  3. impossibilidade de defesa da vítima;
  4. feminicídio;

e ainda por fraude processual, em concurso material. O inquérito aponta que o quarto onde houve o assassinato foi limpo com ajuda de um edredom e que os quatro projéteis usados nos disparos foram removidos do local. 

Kassio de Mangas dos Santos seguia preso preventivamente por determinação da Justiça. Ele é macapaense, tem 34 anos, é e ex-soldado da PM. O MP, responsável pela acusação, também o descreve como uma pessoa violenta. 

Ao denunciar o PM, os promotores ressaltaram que Mangas já tinha duas ocorrências policiais registradas contra ele na Delegacia da Mulher por ter praticado agressões contra outras ex-namoradas.  

Na cadeia, ele se envolveu em uma confusão com uma agente prisional. Ele foi preso após discutir com ela pelo uso de um celular. Mangas teria praticado desacato e feito ameaças à agente. Leia mais. 

A Justiça concedeu liberdade provisória pelos crimes de desacato ao então servidor público e ameaça, mas ele continuou preso porque responde ao crime de homicídio qualificado. 

Kassio Mangas foi exonerado do cargo que tinha no governo estadual. Ele atuava no Gabinete de Segurança Institucional (GSI). 

 

 

Fonte: Núbia Pacheco/g1 AP -  Foto: Rede Amazônica